Ou seja, para a RFB, serviços personalíssimos são aqueles que não podem ser prestados senão pela própria pessoa do sócio. Com isso, os rendimentos recebidos pela pessoa jurídica são atribuídos diretamente à pessoa física do sócio (como se fossem rendimentos particulares), cobrando-se o imposto de renda respectivo, com aplicação, ainda, de multa de 75%, como pena pela suposta “omissão de rendimentos”.

Na visão da RFB, o sócio se aproveita da tributação mais “favorecida” para as pessoas jurídicas, já que, para as empresas, o imposto sobre a renda não atinge os 27,5% cobrados das físicas.

Tal interpretação não tem amparo legal, a nosso ver, pois a norma de natureza interpretativa inserida no artigo 129 da Lei 11.196/2005, fruto da conversão da chamada MP do bem, deixou claro que poderão se sujeitar aos tributos previstos e aplicáveis às pessoas jurídicas os rendimentos decorrentes da prestação de serviços por pessoa jurídica que apresentem as seguintes características: a) sejam serviços intelectuais, o que inclui os de natureza científica, artística ou cultural; b) tenham caráter personalíssimo ou não; c) designem ou não obrigações a sócios ou empregados da sociedade prestadora dos serviços.

O fato é que, muitas vezes, neste tipo de atuação do fisco (a qual reiteramos ser incompatível com nosso ordenamento jurídico), não são levados em consideração aspectos relevantes que podem envolver a pessoa jurídica, tais como a sua operação absolutamente dentro da lei, o notável propósito societário, ou mesmo a quitação regular dos tributos.

No entanto, este entendimento da RFB vem sendo ultimamente revisto pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), o qual, no segundo semestre de 2011, julgou de forma inédita um caso que se tornou precedente no assunto, ao reconhecer a legitimidade da tributação, na pessoa jurídica, de receitas de serviços prestados pelo sócio, ainda que a título personalíssimo.

Neste julgamento específico foram considerados preenchidos três requisitos impostos pelo Carf: a) a sociedade de profissão regulamentada deve prestar serviços de natureza civil; b) todos os sócios devem estar em condições de exercer a profissão regulamentada, capacitados para tal; c) as receitas da sociedade devem provir da retribuição do trabalho profissional dos sócios.

Com a introdução da Eireli (novo tipo societário), a posição da RFB perdeu ainda mais legitimidade já que a Lei 12.441/2011 previu expressamente que o serviço personalíssimo pode ser feito através da pessoa jurídica. Assim, esta decisão em relação ao passado representa a nosso ver uma correta posição do Carf, cujo perfil está menos “fiscalista” e mais técnico nos casos por eles analisados. Assim, todos dão um passo à frente, principalmente o contribuinte, que geralmente sai atrás na largada.

Jornal do Brasil

Caroline Cassar *