Entre os diversos assuntos incluídos na medida provisória está a mudança na Lei das S/A

Editada no penúltimo dia de governo de Luiz Inácio Lula da Silva, em 30 de dezembro de 2010, para criar instrumentos de estímulo a investimentos de longo prazo em infraestrutura e dar incentivos fiscais para alguns segmentos econômicos, a Medida Provisória 517, que está na pauta de votação de amanhã, na Câmara, chegou ao plenário como um legítimo exemplo de “MP Frankenstein”.

O relator, deputado João Carlos Bacelar (PR-BA), manteve as modificações propostas pelo governo federal na Lei das S/A (6.404/1976). Originalmente, quando saiu do Planalto, a MP 517 já tratava de oito assuntos, misturando incentivos para a área de informática e o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), incentivos para a indústria de equipamentos nucleares e até a definição da cobrança de juros nos empréstimos do Fundo de Financiamento do Estudante do Ensino Superior, o Fies. O texto do Executivo, que contava com 22 artigos, passou a ter 52.

Em meio a essa profusão temática, o governo atendeu com a MP a um pedido do setor produtivo para instituir mudanças na Lei das S/A. O Planalto pegou carona e aproveitou para, entre vários artigos de desoneração tributária, principalmente de IPI, PIS-Cofins e IR, renovar a cobrança de duas taxas embutidas na conta de luz.

A MP 517 prorroga por mais 25 anos (até 2035) a cobrança da chamada RGR (Reserva Global de reversão) e por mais um ano o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica(Proinfa). Somadas, as duas arrecadaram ano passado perto de R$ 3,5 bilhões. A oposição tenta derrubar a RGR.

Debêntures. As mudanças na Lei das S/A servem para estimular o surgimento de um mercado de financiamentos privados para investimentos de longo prazo. A meta é ir criando alternativas aos empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Os bancos públicos, segundo a exposição de motivos do governo, respondem por 90% do crédito com vencimento superior a cinco anos.

Ao mexer no artigo 6.º da Lei, que regulamenta o mercado de debêntures, a MP flexibiliza as regras da emissão dos papéis, que são títulos emitidos por empresas de capital aberto para captar recursos e se financiar – o comprador desse papel vira credor da empresa e aufere rendimentos com o pagamento de juros e a quitação do pagamento principal da dívida. A MP facilita a capitalização das empresas ao, por exemplo, acabar com o limite da emissão de debêntures.

As empresas podem, também, fazer emissões simultâneas. A MP acaba com a obrigatoriedade de colocação de todas as debêntures das séries de emissão anterior e o cancelamento das séries não colocadas como condições para a realização de nova emissão. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o mercado consideram que essa nova regra criada pela MP permite “um aproveitamento mais eficiente de janelas de oportunidade para papéis com diferentes características”.

Créditos do FCVS. O deputado João Carlos Bacelar, no relatório da MP, abriu a possibilidade de redução na tributação decorrente da venda de gás natural e cria instrumento para dar mais agilidade ao Tesouro Nacional na conversão de créditos do Fundo de Compensação de Variação Salariais (FCVS) em títulos CVS.

Pela legislação, o governo tem até 2027 para resgatar esse título. A diminuição da burocracia pode permitir, com a publicação de regulamentação futura, que créditos do FCVS nas mãos dos bancos sejam usados para abatimento de dívidas com o governo federal.

A MP regulamenta a compensação de dívidas federais de empresas por precatórios. A Fazenda deverá ser intimada a dizer, em 30 dias, que débito poderá ser abatido junto à União por meio de um precatório. Se o contribuinte não concordar com as informações da Fazenda, poderá apresentar uma impugnação sobre dados repassados à Justiça. Mas a compensação só será feita quando o processo for considerado transitado em julgado.

A nova proposta deixa claro, porém, que o encontro de contas ficará suspenso até que haja disponibilização financeira – ou seja, liberação do recurso pela União. Para que a falta de dinheiro público não prejudique a empresa, será emitida para a companhia uma certidão positiva com efeitos de negativa.

A certidão negativa serve para comprovar que a empresa não tem pendências cadastrais e débitos com o governo. A compensação de dívidas com precatórios poderá ser usada até mesmo para abater parcelamentos de débitos como os dos Refis.

Fonte: Edna Simão – O Estado de S.Paulo – COLABOROU RUI NOGUEIRA