A possibilidade de empresas serem multadas por não discriminar o preço de mercadorias importadas em notas fiscais gerou uma nova corrida ao Judiciário. Desde segunda-feira, diversas companhias e entidades que representam indústrias têm procurado a Justiça para afastar as obrigações acessórias previstas no Ajuste Sinief nº 19, do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). A norma regulamentou a Resolução nº 13 do Senado, cujo objetivo é combater a guerra dos portos.
Duas entidades já obtiveram liminares que beneficiam seus associados: a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec) e a Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc). A liminar catarinense vale para empresas dos 140 sindicatos associados à entidade. A Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec) também já ajuizou uma ação, que ainda não foi analisada. Já a Confederação Nacional da Indústria (CNI) estuda entrar com um mandado de segurança coletivo contra a norma.
Para as indústrias, a regulamentação é complexa e inaplicável, além de prejudicar o sigilo comercial das empresas. “Nenhuma empresa está preparada para cumprir a regra”, diz o gerente executivo de política econômica da CNI, Flávio Castelo Branco. “No momento, estamos apostando na solução política para que o Confaz amplie o prazo para um ou dois meses. Esperamos também que, nesse período, a regulamentação seja simplificada.”
Para o presidente da Fiesc, Glauco José Côrte, a obrigação abriria dados sigilosos. “Nós deixamos claro na ação que fornecer dados à Receita é uma coisa, mas fornecer dados em uma transação comercial fere a livre iniciativa”, afirma. Côrte diz que o Estado de Santa Catarina possui cerca de 45 mil indústrias e a maioria é filiada a algum sindicato.
A liminar da Abihpec foi obtida no Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, segundo o advogado que representou a entidade no processo, Julio de Oliveira, do Machado Associados. Na decisão, a relatora do caso, desembargadora Maria do Carmo Cardoso, considera que a determinação poderá acarretar inclusive a diminuição de investimentos no país. “A publicidade de tais informações revelará segredos comerciais, relacionados diretamente a aspectos competitivos, como é o caso do know-how de cada atividade empresarial” afirma a magistrada.
Empresas também têm se movimentado para contestar a obrigação, que entrou em vigor anteontem. O advogado Thiago de Mattos Marques, do Bichara, Barata e Costa Advogados, diz que desde segunda-feira pelo menos 50 empresas entraram em contato com o escritório interessadas em ajuizar ações. Para ele, a obrigação pode causar um “desconforto” entre as companhias e seus clientes. “Ao olhar a nota fiscal, o cliente pode ficar com impressão de que a companhia tem uma determinada margem de lucro, mas o valor informado não é o custo porque não inclui transporte, valores alfandegários, gastos com pessoal etc”, diz.
Anteriormente, centenas de empresas de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e Espírito Santo já tinham obtido liminares para serem liberadas da obrigação, que acabou prorrogada pelo Confaz. Em reunião virtual realizada na terça-feira, porém, os representantes das secretarias das Fazendas dos Estados não entraram em acordo sobre uma nova extensão do prazo de adaptação. A proposta discutida no Confaz era para prorrogar o prazo para 1º de agosto.
Além de terem que divulgar o preço das mercadorias importadas nas notas fiscais emitidas, as empresas também precisarão entregar a Ficha de Conteúdo Importado (FCI), que exige uma série de informações extras sobre os produtos que chegam do exterior. O documento deve ser preenchido por todos os envolvidos na cadeia produtiva, o que torna o procedimento muito complexo, segundo a CNI.
Bárbara Mengardo e Bárbara Pombo – De São Paulo e Brasília – Valor Economico