A determinação do conceito de insumo para fins de apuração de créditos de PIS e Cofins pode ser enquadrada no rol das principais controvérsias no campo do direito tributário. Embora as Instruções Normativas 247, de 2002, e 404, de 2004, conceituem insumo para tais propósitos, a interpretação das diretrizes contidas nesses atos administrativos tem gerado debates.
A análise das diversas soluções de consulta editadas pela Receita Federal do Brasil demonstra que o posicionamento das autoridades fiscais acerca do conceito de insumo é ainda bastante restritivo, prevalecendo o entendimento de que somente se enquadram como insumo aqueles itens que sejam efetivamente aplicados ou consumidos na fabricação de bens destinados à venda ou na prestação de serviços, conforme previsto nas mencionadas instruções normativas (nesse sentido, por exemplo as soluções de consulta nº 96, de 2011 e nº 07, de 2011).
Esse entendimento parte de uma “importação”, para o PIS e a Cofins na sistemática não cumulativa, do conceito de insumo previsto na legislação do IPI, o que faz com que as autoridades fiscais apliquem tal conceito sem levar em consideração que são tributos de materialidades distintas – a receita auferida, para PIS e Cofins, e atividades com produtos industrializados, para o IPI.
Analisando as decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), verifica-se que em muitos casos este entendimento foi também adotado. Contudo, já encontramos no conselho decisões em que a abordagem foi diferente.
O posicionamento das autoridades fiscais sobre o conceito de insumo é restritivo
Em uma das mais recentes manifestações do Carf envolvendo o conceito de insumo, proferida quando da análise do processo administrativo nº 11020.001952/2006-22 (publicada no Diário Oficial em 27 de junho de 2011), foi dada aos contribuintes a esperança de que essa questão possa ser debatida com a profundidade que a matéria demanda, evitando que o conceito de insumo para fins de apuração do PIS e da Cofins pela sistemática não cumulativa decorra de uma mera transposição do conceito aplicável ao IPI.
O relator da decisão mencionada adotou a premissa de que, ante a impossibilidade de se adotar a lógica do IPI para definir o conceito de insumo para o PIS e a Cofins, o correto seria aproximar insumo do conceito de despesa dedutível para fins de IRPJ. Em sua opinião, “em vista da natureza das respectivas hipóteses de incidência (receita/ lucro/ industrialização) o conceito de custos previsto na legislação do IRPJ (artigo 290 do RIR/99) bem como o de despesas operacionais previstos no artigo 299 do RIR/99 é bem mais próprio de ser aplicado ao PIS e Cofins não cumulativos do que o conceito previsto na legislação do IPI”.
Em âmbito judicial, embora a discussão acerca da definição do conceito de insumo para fins de apuração do PIS e da Cofins não cumulativos ainda esteja longe de se pacificar, já existem algumas decisões sobre a matéria que merecem destaque.
Parte dos acórdãos que abordam esse tema está em linha com o entendimento manifestado pela Receita Federal do Brasil, no sentido de que somente os insumos diretamente vinculados à produção de bens e serviços é que poderiam gerar o direito a apuração de créditos de PIS e Cofins. Nesse sentido, por exemplo, está o acórdão proferido nos autos do processo 2009.71.07001153-5.
No entanto, recentemente, uma decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (Apelação Cível nº 0029040-40.2008.404.7100/RS) chamou a atenção por se alinhar à posição adotada pelo CARF no processo administrativo nº 11020.001952/2006-22, enquadrando como insumos todas as despesas dedutíveis para fins de Imposto de Renda.
O conceito de insumo para fins de apuração dessas contribuições também está sendo analisado, pelo STJ, nos autos do Recurso Especial nº 1.246.317. A posição que está prevalecendo neste julgamento é intermediária, no sentido de que o conceito de insumo para fins de PIS e Cofins não pode, de modo algum, ser equiparado ao utilizado na legislação do IPI, mas que também não seria o caso de se utilizar o conceito de despesa dedutível para fins do Imposto de Renda, que se mostraria amplo demais.
As Leis nº 10.637, de 2002 e nº 10.833, de 2003 poderiam ter apresentado uma orientação mais clara a respeito do conceito de insumo para creditamento de PIS e Cofins. Contudo, a nosso ver, a ausência de um conceito-padrão legal não autoriza a Receita Federal a atribuir ao vocábulo insumo uma definição que não guarde coerência com a lógica da incidência das referidas contribuições. Assim sendo, definições como as contidas nas Instruções Normativas 247 e 404 não deveriam ser acolhidas, como recentemente reconhecido em alguns precedentes do Carf, do Tribunal Regional da 4ª Região e do STJ. Contudo, não se pode perder de vista que tais conceitos definidos pela Receita Federão são a base para a atuação de seus auditores fiscais, de modo que, caso o contribuinte pretenda pautar-se por outros critérios, tem que estar disposto a litigar com a Fazenda.
Sergio André Rocha e Ana Carolina Barreto são, respectivamente, sócio da Consultoria Tributária da Ernst & Young Terco; e advogada.