Foi admitida a existência de repercussão geral em recurso que será analisado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a concessão de crédito de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços) nos casos em que a operação inicialmente tributada seja feita em estado que concede, unilateralmente, incentivo fiscal. O tema constitucional foi analisado pelo Plenário Virtual do STF nos autos do Recurso Extraordinário (RE) 628075, de relatoria do ministro Joaquim Barbosa.
No recurso, uma indústria questiona decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), que legitimou a negativa do estado em estornar integralmente à empresa o ICMS por ela pago na compra feita em frigorífico do Paraná. A Receita Pública gaúcha concordou em restituir (em forma de crédito) apenas parcialmente o valor destacado nos documentos fiscais de venda, alegando que na operação realizada em território paranaense houve concessão ilegal de incentivo fiscal. O crédito concedido foi de apenas 5% sobre as compras realizadas no Paraná, embora a alíquota destacada na nota fiscal fosse de 12%.
De acordo com o RE, a decisão fere os princípios da separação dos Poderes e da legalidade, assim como o artigo 155, parágrafo 2°, inciso I, da Constituição, segundo o qual o ICMS deve ser recolhido de forma não cumulativa. Pelo dispositivo, o contribuinte tem o direito de abater do ICMS a pagar do montante pago pelo tributo na etapa anterior da operação e destacado no documento fiscal de compra. A norma constitucional visa evitar que o contribuinte pague duas vezes o mesmo tributo, fazendo com que ele incida somente no incremento de valor que o bem experimenta no processo produtivo.
Para o TJ-RS, no entanto, a decisão do estado em conceder crédito apenas parcial referente ao ICMS constante na nota fiscal de compra do produto é legítima em operações realizadas em unidades da federação que concedem incentivos tributários de forma unilateral, em afronta à legislação. Tanto a Receita estadual quanto o Tribunal se basearam no artigo 8° da Lei Complementar nº 24/75, e no artigo 16, inciso II, da Lei Estadual do RS 8.820/89, que impedem a concessão do crédito quando na operação de origem houver isenção do imposto de forma unilateral, sem a existência de convênio firmado entre unidades da federação autorizando o incentivo.
“Penso que a matéria transcende interesses individuais meramente localizados e tem relevância institucional incomensurável”, ressaltou o ministro Joaquim Barbosa ao encaminhar a matéria para o exame da repercussão geral no Plenário Virtual. O relator do RE lembrou que o STF recebe, constantemente, inúmeras ações diretas de inconstitucionalidade questionando incentivos tributários concedidos por estados de forma supostamente ilegal. Entre novembro de 2010 e janeiro de 2011, 11 ações desse tipo foram propostas na Suprema Corte, conforme destacou o ministro.
“Para solucionar o que entendem como lesões aos interesses locais, alguns entes federados têm anulado unilateralmente os efeitos econômicos dos benefícios fiscais, com o uso da autonomia legislativa e administrativa que a Constituição lhes confere”, alertou. Segundo ele, é essa a questão de fundo discutida no referido RE: “saber se os entes federados podem, reciprocamente, retaliarem-se por meio de sua autonomia ou, em sentido diverso, compete ao Poder Judiciário exercer as contramedidas próprias da atividade de moderação (checks and counterchecks)”.
Joaquim Barbosa registrou, ainda, que a imprensa tem noticiado o sistemático desrespeito às decisões do STF sobre a inconstitucionalidade de benefícios fiscais em matéria de ICMS, situação esta que favorece a retaliação unilateral como forma de dar efetividade à interpretação que cada estado faz da Constituição.
Fonte: Supremo Tribunal Federal