DCI / SP

Abnor Gondim

Os governos estaduais podem deslocar a tributação de 400 mil itens para concentrar em apenas 10 produtos. Isso vai aumentar a arrecadação tributária, a competitividade das empresas e a isenção da maioria dos produtos consumidos pela população brasileira. A fórmula consta de uma proposta de emenda constitucional em tramitação no Congresso e pode virar realidade no Estado do Pará, com a nomeação do autor da proposta, o deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), ao cargo de secretário da Fazenda.

“Diminuiria bastante a forma predatória com que é utilizado o ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços], no qual se concede uma série de privilégios e benefícios para algumas empresas e nada para o conjunto das outras”, afirmou Hauly, considerado um dos mais influentes congressistas, de acordo com o Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), e reconhecido especialista em matéria tributária. Confira a entrevista exclusiva ao DCI.

Quais os itens mais relevantes para que haja essa seletividade e concentração da cobrança do ICMS?

Energia elétrica, combustível e comunicação representam 50% da arrecadação do Estado do Paraná. Cigarros, bebidas, veículos, eletroeletrônicos, eletrodomésticos, pneus e autopeças representam cerca de 25% da arrecadação. Aí nesses itens, você já tem uma seletividade natural em que ela vem com o processo que foi implantado no Brasil desde 1966 com a criação do ICM e acentuado com a inclusão da energia, combustíveis, comunicação, transporte, minerais, pela Constituição de 1988.

Os outros itens ficariam isentos?

Sim, seriam isentados de ICMS. A carga seria realocada.

Isso está sendo feito desde a administração passada no Paraná?

A questão é ajustar mais um pouco para calibrar a arrecadação nesses itens, que são os principais da arrecadação dos estados brasileiros. E aí partir para uma nova etapa. Eu não posso fazer nada agora, não posso mudar nada, só no próximo ano. Estou falando que as minhas teses de seletividade defendidas no Congresso ficaram mais próximas com a substituição tributária. Pode tributar somente esses itens que foram selecionados, calibrar na tributação deles e substituir todos os 400 mil itens da economia. Assim, nenhuma outra empresa, nem micro, nem pequena, nem média, nem grande, pagaria mais ICMS.

E isso não entra em conflito com a proposta da Frente Parlamentar das Micro e Pequenas Empresas no sentido que a substituição tributária não atinja o segmento?

Aí é outro capítulo. Realmente, entre as propostas de alteração da legislação que fiz em 2006 e as subsequentes há preocupação em resolver o problema da substituição tributária nas micro e pequenas empresas. Estamos falando de duas coisas. Uma é estruturante para frente. A outra é formuladora para o problema atual que nós temos em decorrência da forma acentuada que foi intensificada no Brasil inteiro a cobrança da substituição tributária nos últimos quatro anos.

A proposta tributária em curso no Paraná recupera esses benefícios que as micro e pequenas empresas perderam por causa da substituição tributária?

O Paraná tem isenção para micro e pequena empresa com faturamento de até R$ 360 mil por ano. Daí até $ 2,4 milhões, têm benefícios bem maiores do que os outros estados. Então o Paraná já tem uma legislação para micro e pequena empresa que é modelar para o País. Mas estamos falando sobre grandes mudanças do ICMS a partir do movimento interno que nós queremos levar junto com outros secretários de Fazenda de todo o País.

Isso é um caminho para a reforma tributária?

Podemos fazer a discussão da reforma tributária no Congresso em relação aos recursos federais, mas também, com os secretários de Fazenda e os governadores, encontrar nosso próprio caminho.

Como está a aliança que o sr. está fazendo com estados vizinhos para combater a sonegação do ICMS?

Criamos um Fórum na semana passada [no início de março], com os secretários da Fazenda do Sul e do Sudeste. Tem uma expectativa muito grande em relação a esse fórum, inclusive para combatermos a fraude, a sonegação, todas as formas de manipulação contra o ICMS no Brasil.

O sr. já falou que a arrecadação do ICMS no Paraná não acompanha o crescimento do estado. É por causa da sonegação?

Não sabemos ainda. Estamos fazendo estudos para saber se é a sonegação, a guerra fiscal, a proibição constitucional porque a Constituição de 88 criou duas exceções ao ICMS de origem – energia elétrica e petróleo. E o Paraná perde R$ 1 bilhão por ano, não arrecadando o ICMS da energia que sai do Paraná para os outros estados. Também temos perdas expressivas dos produtos que saem in natura, semielaborados, os grãos, etc, por causa da Lei Kandir e cujas perdas o governo federal não tem ressarcido. Temos perdas também pela guerra fiscal.

O sr. consideraria um contrassenso o governo anunciar um corte de R$ 50 bilhões e, ao mesmo tempo, programar a criação de mais um ministério – o 38º, que vai ser o Ministério da Micro e Pequena Empresa?

No meu entendimento e da Frente Parlamentar das Micro e Pequenas Empresas, a criação desse ministério seria um desmembramento do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic). Deve ser criado para dar status a um setor que representa 99% das empresas no Brasil. Isso pode ser feito sem aumento de despesas, dividindo pessoal e apenas constituindo um ministro da Micro e Pequena Empresa. Não vejo isso como contrassenso. Agora, criar um ministério 0 km, criar novas despesas, cargos em comissão, aí sim será um contrassenso. Ou pode-se transformar o Mdic no novo ministério.

Nessa conjuntura de cortes do governo federal, há espaços para aumentar, de R$ 2,4 bilhões para R$ 3,6 bilhões, o teto de enquadramento do Super Simples, os segmentos que podem optar por esse regime tributário reduzido?

Ao governo cabe fazer opção. A nossa opção sempre foi pela micro e pequena empresas, pelas cooperativas, que são as que geram mais emprego. 70% dos empregos vêm delas. Desde o Plano Real [criado em 1994], não houve um ano em que a arrecadação federal não tenha superado o anterior e inclusive o crescimento do PIB [Produto Interno Bruto]. Da Constituição de 1988 pra cá, a arrecadação saltou de 22,4% para mais de 35% do PIB. Portanto, há espaço muito grande hoje para apoiar a micro e pequena empresa e a listas das atividades para serem incluídas no Super Simples.

Há espaços para o ressurgimento da CPMF?

Se o governo utilizar essa ferramenta de cobrança das movimentações financeiras para substituir inteiramente as contribuições previdenciárias patronais, calibrando as alíquotas, vai ser uma revolução na tributação brasileira.

É verdade que o sr. deu um ultimato à multinacional de alimentos Bunge para fazer os investimentos no estado que se comprometeu a fazer em troca de subsídios fiscais?

Foi uma mentira muito grave. Nós entendemos os problemas das empresas, tendo em vista a conjuntura da agricultura, que tem sofrido demais, por conta do deplorável câmbio que o Brasil tem, com um dólar dos mais baixos do mundo, trazendo prejuízos para economias como a do Paraná e de estados produtores e agroindustriais do País. Isso prejudica também as empresas exportadoras do setor.