A Fazenda do Estado de São Paulo adotou uma nova forma de cobrar contribuintes inadimplentes. Está requerendo em execuções fiscais a penhora de recebíveis de cartões de débito e crédito. O alvo é o varejo. Sessenta solicitações, envolvendo milhões de reais em débitos do ICMS, já foram apresentadas à Justiça e, em boa parte dos casos, primeira e segunda instâncias estão decidindo favoravelmente ao Fisco.
Em uma disputa envolvendo uma empresa do setor farmacêutico da Baixada Santista, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) aceitou a substituição da penhora de medicamentos por recebíveis. O relator do caso na 9ª Câmara de Direito Público, desembargador Décio Notarangeli, entendeu que os bens arrestados inicialmente são de difícil alienação “pelo reduzido interesse de terceiros” e que a apreensão de recursos oriundos de cartões é legal, já que os créditos podem ser classificados como dinheiro, primeiro item da lista de bens penhoráveis prevista no artigo 11 da Lei nº 6.830, de 1980, que trata da cobrança judicial de contribuintes inscritos em dívida ativa.
“É medida que tem pleno respaldo e se acha expressamente previsto em lei, nada havendo de ilegal ou irregular nessa forma de constrição”, diz o desembargador, acrescentando que a penhora de recebíveis não pode ser comparada ao arresto de percentual sobre faturamento, já que “a maior parte das vendas no comércio varejista se faz mediante pagamento à vista, em dinheiro ou por meio de cheques”. Ele considerou também que o baixo valor do crédito tributário em discussão – menos de R$ 5 mil – não traria riscos à saúde financeira da empresa.
A penhora de recebíveis de cartões foi adotada pela Fazenda paulista em novembro do ano passado. Em um primeiro lote, foram protocolados 33 requerimentos em execuções fiscais, que buscam recuperar R$ 238,6 milhões em débitos de ICMS. De acordo com o subprocurador geral do Estado do contencioso tributário-fiscal, Eduardo José Fagundes, a medida foi bem aceita pelo Judiciário. “Estamos ganhando em mais de 90% dos casos”, diz. “Analisamos várias vias de recuperação de crédito e decidimos optar por esse caminho. É um procedimento eficaz para as empresas do setor varejista. Para a área industrial, continuaremos optando pela penhora on-line de conta corrente”.
No entanto, para a advogada Nadime Meinberg Geraige, do escritório Maluf e Geraigire Advogados, que defende alguns contribuintes que sofreram penhoras de recebíveis, a medida é ilegal e coloca em risco a saúde financeira dos contribuintes, além de configurar uma quebra de sigilo bancário. “Mais de 90% dos pagamentos no varejo são feitos por meio de cartões de crédito e débito”, afirma, acrescentando que a disputa judicial com a Fazenda paulista está acirrada. “Está bem dividida. Vencemos em metade dos casos.”
Um restaurante de São Bernardo do Campo conseguiu no Tribunal de Justiça paulista derrubar a penhora de créditos de cartão. O caso foi analisado pela 7ª Câmara de Direito Público. O relator do agravo de instrumento apresentado pelo contribuinte, desembargador Moacir Peres, entendeu que a operação não está enquadrada no rol do artigo 11 da Lei nº 6.830. Ele citou, inclusive, precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), relatado pelo ministro Luiz Fux e publicado em 2003. A disputa envolve a Fazenda do Estado do Bahia. De acordo com o ministro, além de não estar prevista na lista de bens penhoráveis, a medida “implicaria carrear para as administradoras de cartão responsabilidade patrimonial não prevista em lei”.
Fonte: Arthur Rosa – De São Paulo VALOR ECONÔMICO – LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS