Os Estados começaram a se movimentar, no Judiciário, para evitar que sejam obrigados a cobrar das empresas os benefícios fiscais derrubados pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em junho, a Corte declarou a inconstitucionalidade de diversas leis de seis Estados e do Distrito Federal, que concediam incentivos fiscais sem o aval prévio do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Agora, o Mato Grosso do Sul e o Rio de Janeiro entraram com recursos no próprio STF para tentar reverter a decisão ou limitar seus efeitos.
O Mato Grosso do Sul pede, em embargos de declaração, que os ministros “modulem os efeitos da decisão” – ou seja, esclareçam se ela também tem implicações no passado, ou se vale somente a partir do momento em que transitar em julgado – quando não couber mais recurso. O pedido é de que ela só se aplique daqui para a frente. Isso porque, se os ministros optarem pela outra hipótese, o Estado estaria obrigado, tecnicamente, a cobrar das empresas todos os benefícios usufruídos até o momento.
A ação contra o Mato Grosso do Sul foi apresentada pelo governo do Paraná, para questionar incentivos fiscais ao setor industrial, através do programa MS Empreendedor. Assim como nas outras ações, o Supremo considerou os benefícios inconstitucionais.
O Mato Grosso do Sul afirma, no recurso, que muitas indústrias só se instalaram e investiram no Estado por causa dos benefícios. “A cassação poderá gerar um prejuízo incalculável a esses empreendedores, capazes de inviabilizar toda a atividade industrial em curso”, diz o Estado. Segundo os procuradores do Estado, “a cobrança retroativa do ICMS vai gerar, inequivocamente, um enorme contencioso envolvendo o Estado e as empresas beneficiárias”. Segundo dados do processo, o MS Empreendedor resultou na instalação ou ampliação de 348 empreendimentos industriais, com investimentos de R$ 12,8 bilhões e a geração de mais de 76 mil empregos.
“A decisão (que derrubou os incentivos) traz um cenário de instabilidade para quem já aplicou inúmeros recursos na implantação de empreendimentos no Estado em razão do benefício fiscal”, diz o procurador-geral do Mato Grosso do Sul, Rafael Coldibelli Francisco, que assina a ação. “O objetivo do pedido é justamente trazer segurança jurídica tanto para as empresas quanto para o Estado em relação à aplicação da lei.”
O advogado Leandro Martinho Leite, do Leite, Martinho Advogados, considera improvável que os Estados venham a cobrar, de fato, os benefícios passados que eles mesmos concederam – pois isso contraria seus próprios interesses. Mas, tecnicamente, uma anistia também dependeria de acordo com o Confaz. Como isso não ocorreu até o momento, os contribuintes estão numa situação de incerteza.
Para o advogado Marcos Joaquim Gonçalves Alves, do Mattos Filho Advogados, uma manifestação do STF poderia contribuir para resolver o problema. “O Supremo decidiu a matéria pensando no tema guerra fiscal e no ato do governador. Mas não pensou na consequência disso para os contribuintes. O Supremo terá agora a oportunidade de voltar ao tema e analisar o reflexo da decisão”, afirma.
Além do Mato Grosso do Sul, a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) entrou com recursos para tentar reverter o posicionamento do STF em duas ações. Uma das decisões derrubou uma lei que reduzia o ICMS nas operações internas com querosene de avião. A outra declarou inconstitucional um decreto que eliminou o ICMS nas importações de equipamentos de ginástica. A Alerj argumenta, em um dos casos, que teria havido “omissão” na decisão – os ministros não teriam analisado o argumento de que não houve “violação direta” à Constituição. No outro recurso, reclama que a Advocacia-Geral da União (AGU) se posicionou, no caso, pela inconstitucionalidade das leis, enquanto deveria, conforme seus argumentos, defender a validade de toda legislação. Especialistas consideram, no entanto, que a possibilidade de reverter esses dois julgamentos é remota.
Fonte: Valor Economico