O regime da desoneração da folha de salários foi introduzido inicialmente no ordenamento jurídico pela Medida Provisória 540/2011. Essa Medida Provisória foi convertida e deu origem à Lei 12.546/2011, o qual determinou a substituição da contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a remuneração paga aos segurados empregados, avulsos e contribuintes individuais (artigo 22, da Lei 8.212, de 24 de julho de 1991), pela contribuição social incidente sobre receita bruta auferida pelas empresas de determinadas atividades.

Ao estabelecer que base de cálculo da contribuição previdenciária substitutiva seria a receita bruta, a Lei 12.546/2011 também determinou que somente poderiam ser excluídos do cálculo dessa receita bruta os seguinte valores: (i) a receita bruta de exportações; (ii) a receita bruta decorrente de transporte internacional de carga; (iii) as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos; (iv) o IPI, se incluído na receita bruta; e (v) o ICMS, quando cobrado pelo vendedor dos bens ou prestador dos serviços na condição de substituto tributário.

Nessas condições, tanto o Fisco Federal como as empresas, em observância ao disposto na legislação, passaram a incluir na determinação da base de cálculo da contribuição previdenciária sobre a receita bruta as parcelas do ISS devidas aos Fiscos Municipais e os montantes de ICMS devidos aos Fiscos Estaduais, aumentando, dessa forma, a base de cálculo e, por consequência, a própria contribuição previdenciária recolhida nessa nova sistemática.

Muito embora a Lei 12.546/2011 não tenha trazido uma conceituação específica para o termo “receita bruta”, já que foi vetado o item do projeto de lei de conversão da Medida Provisória 540/2011 que incluía a referida conceituação, a própria Receita Federal editou e publicou o Parecer Normativo RFB 3/2012, no qual reconhecem a lacuna legislativa e fazem um esforço interpretativo para definir o que seria “receita bruta” para fins de cálculo e recolhimento da nova contribuição previdenciária.

Nesse sentido, o Parecer Normativo RFB 3/2012 adota a premissa de que diante da omissão da Lei 12.546/2011 deve ser inferido que o legislador adotou o conceito de receita bruta já utilizado na legislação de outros tributos federais, motivo pelo qual se recorreu a legislação das contribuições ao PIS e à Cofins para obter tal conceituação, uma vez que tais contribuições também têm como fato gerado o auferimento de receita por pessoa jurídica.

Seguindo essa premissa, a Receita Federal concluiu que deveria ser adotado para fins de cálculo da referida contribuição previdenciária o mesmo conceito de receita bruta adotado no cálculo das contribuições ao PIS/Cofins.

A conclusão tem implicações relevantes para os contribuintes, sendo uma das mais importantes a possibilidade de discutir judicialmente a exclusão do valor do ICMS e do ISS no cômputo da receita bruta, já que esses tributos não são receita do contribuinte, mas sim dos entes municipais e estaduais a que se destinam.

A discussão a respeito dessa exclusão não é nova em relação ao PIS/Cofins e poderia ser perfeitamente aplicada no cálculo da contribuição previdenciária criada pela Lei 12.546/2011.

É preciso destacar a esse respeito que, embora o Supremo Tribunal Federal ainda não tenha decidido de forma definitiva sobre a constitucionalidade da inclusão do ICMS e do ISS na base de cálculo do PIS e da Cofins, o STF iniciou o julgamento da questão (RE 240.785/MG)[1] e já proferiu 6 (seis) votos favoráveis aos contribuintes.

Além disso, outros tribunais de instâncias inferiores, como o Tribunal Regional Federal da 3º Região já proferiram decisões recentes a favor dos contribuintes para excluir o ICMS e o ISS do valor da receita bruta utilizada no cálculo do PIS e da Cofins.

Por fim, vale salientar que, ainda que a questão esteja pendente no STF no que diz respeito ao PIS e à Cofins, as empresas que se sentirem prejudicadas podem ingressar judicialmente desde já para pedir a exclusão do ICMS e do ISS do valor da receita bruta utilizado no cálculo da nova contribuição previdenciária criada pela Lei 12.546/2011.

As empresas que assim o fizerem poderão se aproveitar de uma possível decisão favorável do STF em relação ao PIS e a Cofins também para a contribuição previdenciária às quais estão sujeitas, aumentando assim uma potencial economia tributária e fazendo valer o seu direito de forma ampla.


[1] Vale esclarecer que, apesar de o julgamento do RE nº 240.785/MG ter sido suspenso pelo próprio STF em razão do deferimento da Medida Cautelar em Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 18-DF (“ADC nº 18), sob o entendimento de que o julgamento de ação ajuizada visando o controle concentrado da mesma questão deve preceder ao controle difuso, isso em nada prejudica o expresso entendimento dos Ministros em seus votos no aludido Recurso Extraordinário. Ressalte-se que, até o momento, não há nenhum voto na ADC nº 18, devendo, portanto, prevalecer a manifestação da maioria dos Ministros no RE nº 240.785/MG.

Fonte:

William Roberto Crestani é advogado, associado da área tributária do Pinheiro Neto Advogados.

Revista Consultor Jurídico, 11 de outubro de 2013