O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) decidiu, por unanimidade, que advogados podem receber antecipadamente honorários de sucumbência de até 40 salários mínimos (R$ 21,8 mil) nas causas ganhas contra a Fazenda Pública – quando o cliente, credor do Fisco, é pago por meio de precatórios, num sistema que costuma tardar anos. De acordo com a decisão, os honorários têm natureza distinta do crédito discutido judicialmente, e, portanto, podem ser desmembrados do valor total.
Embora o TJ-RJ tenha uma súmula permitindo o recebimento antecipado dos honorários, muitos magistrados vinham impedindo essa sistemática. Por isso, o assunto foi remetido ao Órgão Especial da Corte, composto por todos os seus desembargadores. A 13ª Câmara Cível do TJ-RJ pediu ao órgão que se manifestasse por meio de um incidente de uniformização de jurisprudência, julgado na segunda-feira, 11, em favor dos advogados.
Quando a União, Estados e municípios são condenados na Justiça, os credores são pagos com precatórios. Os detentores desses títulos entram numa fila para aguardar o recebimento do dinheiro, que pode demorar anos. Mas para valores menores, o pagamento é feito de forma mais rápida, em até 60 dias, por meio da chamada requisição de pequeno valor (RPV). No caso da Fazenda estadual, créditos de até cerca de R$ 22 mil são pagos por RPV.
O que o TJ-RJ afirmou é que, mesmo em condenações que demandem a emissão de precatórios, honorários de sucumbência de até 40 salários podem ser pagos por RPV. Os magistrados confirmaram a Súmula nº 135 do TJ-RJ, segundo a qual esses honorários “constituem verba autônoma, de natureza alimentar, podendo ser objeto de requisição específica e independente” da condenação devida à parte.
Editada em 2007, a súmula vinha perdendo força com mudanças na composição do tribunal, segundo advogados fluminenses. Alguns juízes passaram a impedir a liberação antecipada dos honorários, gerando descontentamento da classe.
A seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ) entrou no caso analisado pelo TJ-RJ como amicus curiae, argumentando que pequenas bancas poderiam ir à falência se impedidas de receber honorários em até 60 dias. “Existem escritórios que praticamente vivem de honorários de sucumbência”, diz o advogado Ronaldo Cramer, procurador-geral da OAB-RJ.
Já o Ministério Público do Rio argumentou que os advogados não poderiam receber honorários de sucumbência, mesmo em valores menores, antes de seus clientes receberam seus créditos. Para os promotores, os honorários não podem ser desmembrados do crédito principal, pois fariam parte da mesma discussão processual. O MP cita precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) nesse sentido.
A discussão remete a diferentes interpretações do artigo 100 da Constituição. O MP ressalta que o parágrafo 8º desse artigo veda o fracionamento dos precatórios. Advogados citam o parágrafo 1º, segundo o qual créditos de natureza alimentícia serão pagos com preferência sobre os demais. O TJ-RJ acolheu o argumento de que os honorários de sucumbência se inserem nesse critério.
Advogados comemoraram a decisão. “Estamos aliviados porque temos casos de profissionais esperando muitos anos para receber”, afirma Márcio Freitas, do escritório Capella, Freitas, Recarey Advogados Associados, do Rio.
Mas a questão ainda deverá ser definida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na análise de um recurso em que o Estado do Rio Grande do Sul tenta evitar o pagamento de honorários por RPV. “Não pode haver um fracionamento da execução”, sustenta Nei Brum, procurador do Estado. “O valor integral do título tem que ser observado para identificar o meio no qual ele será pago, ou seja, precatório ou RPV.” Para o procurador, alterar esse sistema implicaria quebra da ordem cronológica de pagamento. “É como se houvesse mais de um credor, e um deles recebesse primeiro.”
Segundo o advogado Rogério Mansur Guedes, que defende tese contrária no STF, o TJ-RS já vem pagando os advogados por RPV. “Já está sacramentado”, afirma, citando o Estatuto da OAB, que prevê o pagamento de honorários de forma autônoma. O julgamento no STF está em cinco votos favoráveis ao pagamento antecipado dos honorários de sucumbência, contra um pela impossibilidade de se desmembrar o crédito, como votou o presidente da Corte, ministro Cezar Peluso. A análise foi interrompida em dezembro de 2008 por um pedido de vista da ministra Ellen Gracie.
Maíra Magro – De Brasília