O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, indeferiu pedido de liminar em Habeas Corpus (HC 107331) impetrado pela defesa de empresário do Rio Grande do Sul condenado por não recolher ao INSS os valores descontados dos salários de seus funcionários a título de contribuições previdenciárias em diversos períodos entre 2000 e 2004. A defesa pretendia a aplicação ao caso do princípio da insignificância (ou bagatela) – acolhido inicialmente pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), mas afastado pelo Superior Tribunal de Justiça.

 A dívida, inicialmente de R$ 19.712,00, foi parcelada. Com a exclusão das parcelas quitadas, o valor atual do débito é de R$ 7.589,00. A Defensoria Pública, na inicial do HC, afirma que o valor restante é inferior ao patamar de R$ 10 mil estabelecidos para os débitos tributários em geral para fins da aplicação do princípio da insignificância.

 Citando precedente do STF, o despacho do ministro Gilmar Mendes explica que o valor mínimo de R$ 10 mil, previsto na Portaria MPAS 4.943/1999, diz respeito apenas ao ajuizamento de ação de execução, sem, entretanto, que haja extinção do crédito. “Não se pode invocar tal dispositivo legal para fazer incidir o princípio da insignificância, visto que, nesses casos, não há extinção do crédito tributário, mas mera autorização para o não ajuizamento da execução”, informa o precedente citado. A extinção do crédito fiscal é regulamentada pela Lei nº 9.441 e atinge apenas aqueles que não ultrapassarem o montante de R$ 1 mil. “Dos documentos acostados aos autos, não constato a existência dos requisitos autorizadores da concessão da liminar”, concluiu.

 CF/CG

Processos relacionados
HC 107331

Fonte: STF

 

DECISÃO: Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado pela Defensoria Pública da União, em favor de Alvori Benvenhu. Nestes autos, a defesa questiona acórdão proferido pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que conheceu e deu provimento ao Recurso Especial n. 1.134.388/RS.

 O paciente foi condenado pela prática do delito descrito no art. 168-A, § 1º, I, c/c 71, ambos do CP, à pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos.

 Segundo a denúncia, o acusado, na condição de responsável legal pela empresa Benvenhu & Dias Ltda., teria deixado de recolher aos cofres do INSS importâncias descontadas dos salários de seus funcionários, a título de contribuições previdenciárias, nos períodos compreendidos entre novembro/2000 e fevereiro/2001, dezembro/2001 e dezembro/2003, e nos meses de fevereiro e março/2004, gerando Lançamento de Débito Confessado n. 35.686.359-0, no valor de R$ 19.712,56.

 Irresignada, a defesa interpôs apelação perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sustentando: a) ausência de tipicidade (princípio da insignificância); b) extinção da punibilidade ou suspensão do processo pelo parcelamento da dívida; e c) excludente de culpabilidade (inexigibilidade de conduta diversa em decorrência das dificuldades financeiras experimentadas pela sociedade).

  O TRF da 4ª Região deu provimento ao recurso para absolver o paciente pela aplicação do princípio da insignificância. Eis a ementa desse julgado:

 “PENAL E PROCESSUAL. ANULAÇÃO. JULGAMENTO.

 FALTA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO RÉU ACERCA DO DECRETO CONDENATÓRIO DE PRIMEIRO GRAU. ARTIGO 168-A, § 1º, INCISO I, DO CP. QUITAÇÃO DE PARTE DO DÉBITO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. REMANESCENTE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. PARÂMETRO. ARTIGO 20 DA LEI N.º 10.522/02. DISPENSA DE EXECUÇÃO FISCAL NA ESFERA ADMINISTRATIVA. ATIPICIDADE DA CONDUTA.

 1. A ausência de intimação do réu acerca da sentença condenatória constitui causa de nulidade. Precedentes. 2. Renovados os atos processuais posteriores, procedendo-se a novo julgamento do feito. 3. Tendo sido possível identificar as competências liquidadas pelo pagamento de parte do débito, extingue-se a punibilidade dessas parcelas, nos termos do § 2º do art. 9º da Lei n. 10.684/2003. 4. Mantida a persecução penal apenas quanto ao período remanescente. 5. Tendo em conta a Lei n. 11.457/2007 que considera também como dívida ativa da União os débitos decorrentes das contribuições previdenciárias (art. 17) – dando, portanto, tratamento igualitário aos créditos tributários – bem como recente entendimento das Cortes Superiores e deste Regional, aplica-se ao delito em questão o princípio da insignificância jurídica quando o valor do tributo não recolhido for igual ou inferior ao estabelecido administrativamente como sendo o mínimo para o ajuizamento de execuções fiscais (R$ 10.000,00 – art. 20 da Lei 10.522/02). Conseqüentemente, a conduta imputada é atípica”.

 O Ministério Público, então, interpôs recurso especial perante o STJ.

 A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça afastou o princípio da bagatela ao argumento de que superaria o limite legal: “constatando-se que a importância que deixou de ser recolhida aos cofres do INSS é superior ao patamar estabelecido no dispositivo legal que determinou a extinção dos créditos oriundos de contribuições sociais, deve ser afastada a aplicação do Princípio da Insignificância”.

 No presente writ, a Defensoria Pública afirma: “o valor restante, ou seja, a inadimplência de R$ 7.589,06 (sete mil quinhentos e oitenta e nove reais e seis centavos) é abaixo dos R$ 10.000 (dez mil reais) estabelecidos para os débitos tributários em geral”.

 Afirma, ainda: “a autoridade coatora, embora tenha reconhecido a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância, alegou que o limite para o crime previdenciário seria de apenas de R$ 1.000,00 (hum mil reais), para o caso de contribuições sociais, e não de 10.000 (dez mil reais), critério dos crimes tributários”.

 Liminarmente, requer a suspensão dos efeitos do acórdão proferido nos autos do Recurso Especial n.  1.134.388/RS até decisão final deste HC.

 No mérito, requer a concessão da ordem pela aplicação do princípio da insignificância (por bagatela própria ou imprópria).

 Passo a decidir tão somente o pedido de medida liminar.

 No caso concreto, discute-se a possibilidade da aplicação, ou não, do princípio da insignificância em virtude da prática de apropriação indébita previdenciária, sendo que o valor das contribuições previdenciárias não recolhidas ao INSS apurado foi de R$ 7.589,06 (sete mil quinhentos e oitenta e nove reais e seis centavos).

 Não reconheço plausibilidade à tese sustentada pela impetrante. A propósito, menciono o seguinte precedente:

   “ PENAL. HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. DÉBITO QUE SUPERA O VALOR FIXADO NO ART. 1º, I, DA LEI 9.441/97. ORDEM DENEGADA. 1. A impetrante pretende a aplicação do princípio da insignificância alegando que a quantia não repassada à Previdência Social pelo paciente é inferior ao valor mínimo fixado na Portaria MPAS 4.943/99, para o ajuizamento de ação de execução. 2. O art. 4º da Portaria MPAS 4.943/99 determina somente o não-ajuizamento da execução, quando o débito inscrito como Dívida Ativa do INSS for igual ou inferior a R$ 10.000,00 (valor modificado pela Portaria MPAS 1.105/02), sem, entretanto, que haja extinção do crédito. 3. Não se pode invocar tal dispositivo legal para fazer incidir o princípio da insignificância, visto que, nesses casos, não há extinção do crédito tributário, mas mera autorização para o não-ajuizamento de execução, que, no entanto, poderá ser ajuizada, quando o valor do débito ultrapassar o limite indicado. 4. A extinção do crédito fiscal está prevista no art. 1º, I, da Lei 9.441/97 e atinge, apenas, os débitos inscritos em Dívida Ativa que não ultrapassarem o montante de R$ 1.000,00 (mil reais). 5. Foi apurado pelo INSS um crédito previdenciário no valor total de R$ 13.884,71 (treze mil oitocentos e oitenta e quatro reais e setenta e um centavos), decorrente do não-recolhimento de contribuições pelo paciente. 6. Habeas corpus denegado” – (HC 100.004/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, maioria, Dje 26.11.2009).

  Dessarte – ressalvado melhor juízo por ocasião da apreciação de mérito –, dos documentos acostados aos autos pela impetração, não constato a existência dos requisitos autorizadores da concessão da liminar pleiteada (fumus boni juris e periculum in mora).

 Nesses termos, indefiro o pedido de medida liminar.

 Estando os autos devidamente instruídos, abra-se vista ao Procurador-Geral da República (RI/STF, art. 192).

 Publique-se.

 Brasília, 11 de março de 2011.

 Ministro GILMAR MENDES

 Relator

 Documento assinado digitalmente.