Os contribuintes ganharam um importante precedente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região (SP e MS) contra a aplicação de multa de 50% sobre pedidos de ressarcimento ou compensação de créditos tributários negados pela Receita Federal. Os desembargadores da 6ª Turma afastaram a imposição da penalidade, que foi instituída em 2010 pela Lei nº 12.249.
Antes da alteração, a legislação previa uma multa de 20% por atraso no recolhimento de impostos compensados indevidamente com créditos tributários. A elevação do percentual da chamada multa isolada prejudica empresas que recolhem PIS e Cofins pelo regime não cumulativo, principalmente as exportadoras, que acumulam muitos créditos.
De acordo com o voto da desembargadora Consuelo Yoshida, que foi seguido pelos demais integrantes da turma, se inexiste má-fé por parte do contribuinte, não há que se falar em multa isolada pelo mero indeferimento. “Enquanto não são decididos os pedidos de ressarcimento ou compensação, não deve haver incidência de juros e multa”, diz.
O entendimento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (Sul do país) também é favorável ao contribuinte. Em julho do ano passado, a Corte Especial declarou a cobrança inconstitucional. A decisão da 3ª Região, que beneficia uma cooperativa de cana-de-açúcar, porém, serve de precedente em Estados com um número maior de empresas.
De acordo com o advogado Flávio Ferreira, do escritório Ferreira e Ferreira Advogados, que representa a cooperativa, o contribuinte tem receio de apresentar pedido de ressarcimento por causa da multa elevada. A cooperativa, que acumulou créditos de aproximadamente R$ 3 milhões, poderia ser penalizada em R$ 1,8 milhão, com juros. “A decisão admite multa elevada apenas para a hipótese de fraude”, afirma.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que vai interpor recurso especial no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e extraordinário no Supremo Tribunal Federal (STF). “Os tribunais superiores deverão colocar um ponto final no debate”, afirma o procurador Leonardo Curty, coordenador da Divisão de Acompanhamento Especial da PGFN.
A Fazenda Nacional argumenta que a medida é importante para o controle dos pedidos de compensação. “Até a implantação da medida, o número de informações inverídicas transmitidas por meio de declarações de compensação era preocupantemente elevado, especialmente porque, desde 2002, o mero pedido do contribuinte tem a capacidade de extinguir o débito objeto de compensação”, diz o procurador.
De acordo com a Fazenda Nacional, não existe no ordenamento jurídico uma garantia do direito à compensação. “Mas regramento legal pode, sim, implementar a penalidade pelo simples pedido indevido”, afirma Curty. “Em relação à avaliação da boa-fé do contribuinte, de acordo com o Código Tributário Nacional, a aplicação de multas punitivas independe de qualquer intenção do agente.”
Na primeira instância, entidades do setor agropecuário também conseguiram derrubar a multa de 50%. Uma sentença da Justiça Federal beneficia os 51 associados da União Brasileira de Avicultura (Ubabef). A vitória foi obtida pelos advogados Marcelo Salomão e Fábio Calcini, do Brasil Salomão & Matthes Advocacia. O escritório também já obteve decisão que favorece os associados do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).
O caso da Ubabef, de acordo com Calcini, também será analisado pelo TRF da 3ª Região. “O precedente da 3ª Região é importante porque, ao confirmar entendimento da 4ª Região, indica que o Judiciário deverá ser contrário à punição de quem simplesmente exerce um direito”, afirma.
Indústria questiona penalidade no Supremo
A multa isolada de 50%, aplicada pela Receita Federal, também será julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). No início do ano, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) apresentou uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) contra dispositivos da Lei nº 12.249, de 2010, que instituiu a penalidade. A relatoria é do ministro Gilmar Mendes, que analisará primeiro o pedido de liminar feito pela entidade.
A Advocacia-Geral da União (AGU) já se manifestou pela validade dos dispositivos questionados. Falta a Procuradoria-Geral da República (PGR) se posicionar. No processo, a CNI alega que a Constituição Federal garante os direitos de petição aos poderes públicos, da ampla defesa e do contraditório. “Tributos não podem ter efeito de confisco e o percentual de 50% viola os princípios da proporcionalidade e razoabilidade”, afirma Cássio Augusto Borges, gerente executivo jurídico da CNI.
Borges argumenta ainda que a norma tem caráter de sanção política, já que seu propósito, segundo o Fisco, é reduzir o número de pedidos de restituição e compensação. “O objetivo é ter mais recursos no caixa do governo federal”, afirma.
A questão também está sendo discutida no Legislativo. A CNI apoia o Projeto de Lei do Senado nº 133, de 2012, de autoria do senador Blairo Maggi (PR-MT), que mantém a punição apenas para o contribuinte de ma-fé.
Laura Ignacio, Valor Econômico