De acordo com especialistas, todos os negócios brasileiros terão que se adaptar à nova forma de declaração de informações trabalhistas, com maior nível de detalhamento
As novas formas de declaração do conteúdo trabalhista das empresas, por meio do chamado eSocial, devem trazer benefícios para empregado e empregador somente em três ou quatro anos. Até lá, os empresários terão muito que fazer, segundo especialistas.
Muito aguardado pelo mercado, o cronograma do eSocial – que faz parte do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped) – foi publicado no Diário Oficial da União somente na semana passada, por meio da Resolução número 1 do Comitê Diretivo do eSocial.
Assinada pelos secretários executivos da Fazenda, Tarcísio de Godoy; da Previdência Social, Marcelo Freitas; do Trabalho e Emprego, Francisco Ibiapina; e da Secretaria da Micro e Pequena Empresa, José Constantino, a norma fixa prazo diferente para a obrigatoriedade de prestar informações relativas ao ambiente de trabalho, a depender do porte do negócio.
As primeiras obrigadas serão as companhias que faturam acima de R$ 78 milhões, que deverão enviar os dados a partir da competência de 2016.
No entanto, todas as empresas, inclusive as de menor porte e empregadores domésticos, até 2017, serão obrigadas a utilizar o eSocial para transmitir informações sobre monitoramento da saúde do trabalhador e condições do ambiente de trabalho, bem como comunicação de acidente de trabalho.
“O cronograma trouxe mais segurança ao empregador de quando as obrigações entrarão em vigor, principalmente para as grandes empresas. Porém, mesmo para as empresas que faturam abaixo de R$ 78 milhões devem começar a se adaptar já. Apesar de ser algo que todos fazem, será uma mudança cultural dentro da empresa”, alerta Daniela Paschoal, especialista em compliance de produto da consultoria ADP.
O supervisor tributário da Easy-Way do Brasil, Marcelo Ferreira, explica que, mesmo para a pequena empresa que conta com dois ou três funcionários pode parecer que a adaptação será mais “tranquila”, mas pelo nível de detalhamento pedido pelo eSocial, a necessidade de iniciar o processo de adequação agora é importante. “O novo sistema vai exigir, por exemplo, informações sobre o dependente se o funcionário o declarar. E se tiver incoerência pode ser um problema”, aponta.
Questionados pelo DCI se, com a atual situação econômica, os custos com essa adequação podem limitar a adequação de todas as empresas, principalmente aquelas que não são as primeiras obrigadas, os especialistas são unânimes em dizer que trará benefícios para o empregador – simplificação das declarações trabalhistas em uma só via – e para o empregado – o qual poderá verificar suas informações trabalhistas de forma mais rápida e eficiente. Para o supervisor tributário da Easy-Way e para especialista da ADP, essa situação pode começar a ocorrer entre 2018 e 2019.
“Eu sinto que os custos não serão muito altos para as empresas, já que essa adaptação é uma necessidade de regularização do sistema trabalhista. Com o funcionamento da nova forma de declarações é que os custos subirão, para aqueles que não declaravam as informações dos seus funcionários corretamente. A fiscalização será maior”, prevê Anna Carolina Cabral, sócia do Queiroz Cavalcanti Advocacia.
Por outro lado, Ferreira reconhece também que para aqueles que ainda colhiam as informações dos funcionários de forma manual – como em pequenos comércios – o custo com implementação de softwares e consultorias, pode ser muito maior.
Dúvidas
Os consultores entrevistados pelo DCI afirmam, porém, que ainda há muitas dúvidas sobre as regras já existentes. No caso das pequenas empresas, Renato Mendes Concordia, especialista tributário da Synchro, diz que, pela norma prevista na Resolução 1 do Comitê Diretivo do eSocial, ainda não está claro como será o processo de adaptação por essas companhias. “Minha sensação é de que será semelhante ao que será feito pelas grandes empresas. Mas não está nada certo”, avalia.
Ao mesmo tempo, Anna Carolina comenta que, pelo menos no Nordeste, onde o escritório está localizado, como ocorreram muitas prorrogações de prazos e muitas resoluções sobre o eSocial, criou-se uma “zona de conforto” que adiou também a necessidade de discutir sobre essa adequação. “Houve algumas palestras sobre o tema, mas ficou tudo muito na teoria. E os clientes ainda não estão buscando esclarecer suas dúvidas para se adaptar. Acredito que a demanda tende a crescer no segundo semestre e o que foi discutido seja colocado em prática também”, diz.
Já Tânia Gurgel, coordenadora do SPED e NFe na Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB SP) e sócia da TAF Consultoria Empresarial, afirma que as regras podem sofrer novas alterações em vista de incoerências. “Ainda não foi divulgado o prazo para o ambiente de teste determinado pelo decreto 8.373 de 2015 [que institui o eSocial], o qual, acredito, que não permitirá que as empresas estejam prontas até setembro de 2016″, exemplifica.
Outra questão apresentada por ela é de que o empregador doméstico foi mencionado pela Resolução 1 como um dos negócios cujo tratamento diferenciado será definido em atos específicos. “Mas pela Lei Complementar 150 de 2015 [que dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico] está definido que essa adequação ao eSocial deve ocorrer até outubro deste ano. Ou seja, precisamos ter um equilíbrio legal das leis”, sugere.
Além disso, Tânia diz que não está claro nas normas referentes ao eSocial que o setor público está livre de se adaptar ao novo sistema. “O setor público também fatura até mais de R$ 78 milhões e falta uma palavra que demonstre que eles estão livres. O governo não poderá apertar o setor privado em se atualizar se terão que fazer o mesmo, ainda mais que o setor privado passa por dificuldades financeiras por conta da crise econômica”, entende.
Orientação
De qualquer forma, o especialista tributário da Synchro ressalta que as empresas busquem forma de se atualizar e não deixem para a última hora. “Afinal, se a sua empresa estiver em ordem, a entrega será bem simples”, analisa.
“Prestar atenção aos detalhes dos processos que geram as informações dos trabalhadores é um das dicas. O livro registro de empregados, por exemplo, não é preenchido com todos os dados necessários no dia a dia. E, as informações que estiverem incompletas precisarão ser revistas”, aponta. “Além disso, os empregadores também precisarão fazer a reciclagem do cadastro dos empregados por meio do sistema do eSocial, embora o aplicativo da Qualificação Cadastral ainda esteja indisponível. A atualização dos dados no sistema do eSocial promete garantir a identificação do trabalhador na previdência social, e a validação dos mesmos. Essas informações também ficarão armazenadas no cadastro do cidadão”, acrescenta Mendes Concordia.
Veículo: Jornal DCI – Jornalista Fernanda Bonpam