Uma decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) pode derrubar milhares de ações judiciais de poupadores que ainda tentam receber correções na inflação referentes aos planos econômicos da virada da década de 80, como Bresser e Verão. A 4ª Turma do STJ limitou a cinco anos o prazo para que os correntistas beneficiados por ações civis públicas possam se “habilitar” nesses processos e pedir o pagamento do valor a que teriam direito. O prazo de cinco anos é contado a partir do momento em que a ação civil pública transitar em julgado – ou seja, quando não couber mais recurso da decisão.
Embora os planos econômicos sejam do fim da década de 80, a disputa judicial sobre os expurgos inflacionários ainda persiste. Segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), há atualmente 1.030 ações civis públicas na Justiça, além de cerca de um milhão de ações individuais referentes aos planos econômicos. A decisão do STJ refere-se à controvérsia sobre o prazo para pedir o recebimento dos expurgos. Os poupadores argumentam que é de 20 anos, enquanto os bancos sustentam ser de cinco anos.
Na semana passada, o STJ concluiu pelo prazo de cinco anos, ao manifestar-se pela primeira vez sobre o período aplicável às ações individuais de execução – nas quais os beneficiados pelas ações civis públicas pedem para receber os valores a que teriam direito. Os ministros analisaram um recurso da Caixa Econômica Federal (CEF) contra um correntista do Paraná. A instituição havia sido condenada, em uma ação civil pública, a pagar aos poupadores do Estado correções na inflação relativa aos meses de junho de 1987 (plano Bresser) e janeiro de 1989 (plano Verão), somados a juros de 0,5% ao mês. Com base nessa decisão, diversos correntistas entraram na Justiça para receber o montante.
Em um desses processos, a Caixa recorreu ao STJ argumentando que o pedido estava fora do prazo. A ação civil pública contra a CEF, ajuizada pela Associação Paranaense de Defesa do Consumidor (Apadeco), transitou em julgado em 2001. O poupador entrou na Justiça para receber os valores em 2010 – nove anos depois. A Corte concordou com a alegação da instituição bancária.
Ao estipular o período de cinco anos, o relator do processo da Caixa no STJ, ministro Luis Felipe Salomão, tomou como base decisão anterior da própria Corte. No ano passado, a 2ª Seção do STJ já havia estipulado que o prazo para ingressar com ações civis públicas envolvendo planos econômicos também é de cinco anos. Antes, o Judiciário não tinha um entendimento claro a respeito desse prazo, e essas ações eram propostas em até 20 anos. Como a lei das ações civis públicas não trata da prescrição, os ministros aplicaram, por analogia, o período de cinco anos válido para as ações populares.
A Caixa argumentou que o mesmo período deveria se aplicar à ação de execução. Isso tendo como base a Súmula nº 150 do Supremo Tribunal Federal, que diz que a execução prescreve no mesmo prazo da ação principal. Portanto, se a ação civil pública prescreve em cinco anos, a ação de execução só pode ser ajuizada nesse mesmo período de tempo. A decisão do STJ deixa claro, porém, que é de 20 anos o prazo para entrar com ações individuais de conhecimento relativas aos planos econômicos – nas quais se discute se há ou não o direito a receber os expurgos.
A Caixa não quis se manifestar antes da publicação do acórdão do STJ. O advogado do correntista paranaense, Alexandre de Salles Gonçalves, afirmou que vai recorrer. “A decisão viola a coisa julgada, porque o prazo de prescrição definido na própria sentença da ação civil pública foi de 20 anos”, afirma. Ele sustenta que, com isso, a execução deveria seguir o mesmo período fixado na ação principal, no caso concreto. Segundo Gonçalves, o mesmo assunto está para ser julgado como recurso repetitivo pela 2ª Seção do STJ.
Para o diretor jurídico da Febraban, Antonio Negrão, a decisão “garante a segurança jurídica no país e evita a proliferação de milhares de pleitos ilegítimos relacionados a fatos ocorridos há décadas”. Os bancos denunciaram recentemente esquemas de fraude nas habilitações em ações civis públicas relativas a planos econômicos. A advogada da Apadeco, Gisele Passos Tedeschi, diz que as fraudes são poucas tendo em vista o universo de poupadores, e que 20 anos não seria um prazo longo demais considerando a hipossuficiência dos poupadores. Apesar da discussão, o STF ainda decidirá se os bancos devem pagar as diferenças dos índices inflacionários.
Maíra Magro – De Brasília