Governo de Minas faz cerco para espremer recursos Na tentativa de contrabalançar perdas na arrecadação e elevar verbas para investimento, Receita de Minas Gerais caça sonegadores de imposto estadual sobre heranças e doações
O mecanismo das doações, para alguns, se tornou estratégia não lícita de transferência de recursos para burlar a Receita, Gilberto Silva Ramos, subsecretário da Receita Estadual de Minas Gerais
Com a crise internacional forçando para baixo a arrecadação de ICMS e a capacidade de investimento do Estado, todo centavo faz diferença para o governo de Minas Gerais, que passa a marcar a cobrança do “primo pobre” do sistema tributário, o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCD). A Secretaria de Estado da Fazenda vai estender, a partir do mês que vem, o pente-fino sobre as doações a terceiros informadas à Receita Federal na declaração de Imposto de Renda (IR). O objetivo é apertar o cerco sobre a cobrança do tributo, que é exclusivamente estadual, taxado sobre herança e sobre doações de qualquer espécie. O leão não morde as doações registradas no acerto do IR. Mas a informação é útil para a Receita Estadual, que arrecada 5% sobre elas.
O governo de Minas começou a caça aos sonegadores do ITCD em setembro. A partir dos arquivos obtidos por meio da Receita Federal, centrou o foco sobre 5 mil contribuintes que declararam doações acima de R$ 200 mil a partir de 2006. A estimativa é de que no período tenham sido realizados R$ 3 bilhões em doações acima de R$ 200 mil – algumas chegando a valores próximos a R$ 20 milhões -, sobre as quais menos de 10% dos contribuintes recolheram o imposto estadual.
As “cartinhas” enviadas pela Receita Estadual aos contribuintes pegos na rede – principalmente empresários, políticos e autoridades – renderam ao Estado, entre outubro e 31 de janeiro, um acréscimo consistente na arrecadação do ITCD. Os últimos três meses de 2011 representaram um aumento de R$ 78 milhões só com a cobrança sobre as doações. Ao final do ano passado foi registrado o recorde de R$ 387 milhões no recolhimento do imposto, um acréscimo de 45% em relação a 2010, quando foram recolhidos R$ 267 milhões.
Só em janeiro deste ano foram arrecadados R$ 38,5 milhões de ITCD aos cofres estaduais, R$ 18 milhões dos quais referentes a doações feitas nos últimos seis anos sem a quitação do imposto. Esse resultado representa um crescimento de 147% em relação a janeiro de 2011, quando Minas Gerais arrecadou com o ITCD R$ 15,6 bilhões.
Se a partir de setembro a Receita Estadual colocou o foco em “grandes doadores” indicados pela Receita Federal, agora ela pretende baixar o teto das doações de R$ 200 mil para R$ 100 mil. Nova rede será lançada sobre o grupo de contribuintes que registraram doações em suas declarações de Imposto de Renda depois de 2006.
“A nossa intenção é ir gradativamente apertando a fiscalização”, explica Gilberto Silva Ramos, subsecretário da Receita Estadual de Minas Gerais. “A cobrança vale para doações de qualquer natureza, em dinheiro, em cotas de sociedades ou em imóveis”, acrescenta. Como no caso da herança, a cobrança de Imposto de Renda não incide sobre as doações. “Por isso, o mecanismo das doações, para alguns, se tornou estratégia não lícita de transferência de recursos para burlar a Receita Federal”, avalia Gilberto Ramos.
Embora a eventual sonegação do Imposto de Renda por meio da estratégia da “doação” não seja o foco da Receita Estadual, a fiscalização em busca do ITCD acaba indiretamente favorecendo a Receita Federal. “Nós identificamos os CPFs que declararam doações por meio dos arquivos da Receita Federal. Buscamos as doações acima de R$ 200 mil e, a partir do mês que vem, também as doações acima de R$ 100 mil. Requeremos que esses contribuintes apresentem as guias de recolhimento do ITCD. Se o pagamento não é comprovado, autuamos e informamos a Receita Federal”, esclarece Gilberto Ramos. Esse poderá ser um sinal à Receita Federal para incluir o contribuinte na malha fina, principalmente se para fugir do ITCD ele tiver retificado a declaração do Imposto de Renda, substituindo a “doação” por um eventual “empréstimo”.
Conheça o tributo
O que é o ITCD
A cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCD) está prevista no artigo 155 da Constituição Federal de 1988. A alíquota é fixada pelo Senado Federal, não ultrapassando 8%. Em Minas Gerais, o ITCD está previsto na Lei 14.941/2003 e é disciplinado no RITCD/05, aprovado pelo Decreto nº 43.981/05. Entre 2006 e 2008 as alíquotas em Minas eram variáveis – de 2% e 4%. A partir de 2008, a alíquota passou a ser única, de 5%.
Quem paga
1) Bens no estado transmitidos por herança;
2) Doações de bens imóveis situados no estado, títulos e créditos;
3) As doações entre marido e mulher e entre pais e filhos também são tributadas.
O que acontece se o contribuinte for pego pela fiscalização do estado e não recolher o imposto
1) A fiscalização estadual emite auto de infração e o contribuinte é chamado a se defender;
2) Se o contribuinte não conseguir justificar-se e recusar-se a recolher o imposto, ele é incluído na dívida ativa do estado.
3) A Advocacia Geral do Estado faz a cobrança judicial.
Ação garante adicional de R$ 18 mi em janeiro
Embora represente apenas 1% das receitas dos impostos estaduais, o ITCD é um tributo exclusivo do estado e pode ser usado em investimentos. “O imposto é pequeno, mas a receita é fundamental. Em janeiro arrecadamos R$ 18 milhões a mais. Imagine o que pode ser feito com esses recursos, por exemplo, no João XXIII”, avalia o subsecretário da Receita Estadual de Minas Gerais, Gilberto Silva Ramos. A expectativa da Receita Estadual é de que o pente-fino sobre aqueles que declararam no Imposto de Renda doações de R$ 100 mil a R$ 200 mil nos últimos seis anos aumentará o volume de recolhimento de novas doações feitas este ano.
Ainda há muita desinformação acerca do recolhimento do imposto sobre doações. O ITCD sempre foi associado a herança. Quando o inventário é feito extrajudicialmente, no cartório, ou perante o juiz de direito, os bens do espólio são avaliados com a assistência de auditores do estado e sobre eles incide a alíquota que passou a ser única, de 5%, em 2008. As escrituras públicas da partilha só são lavradas após o recolhimento do imposto. “As pessoas sempre vincularam o ITCD à causa mortis, nunca às doações. Nas declarações de Imposto de Renda, em geral colocavam doações para justificar transferências de recursos a terceiros, porque não são tributadas pela Receita Federal”, considera Gilberto Ramos.
Antes de setembro de 2011, quando convênio com a Receita Federal cedeu ao estado os arquivos vinculando os códigos das doações feitas nas declarações de renda com os CPFs dos contribuintes, era muito difícil a fiscalização sobre o recolhimento do imposto. “Os doadores agora identificados foram informados que precisam comprovar o recolhimento do ITCD. Neste momento estamos analisando quais contribuintes apresentaram comprovante do recolhimento, quais pagaram espontaneamente e quais ainda não se apresentaram à Receita Estadual. Os devedores serão autuados e os débitos poderão entrar para a dívida ativa, para que a Advocacia Geral do Estado faça a cobrança judicial”, esclarece Gilberto Ramos.
Fonte: Jornal O Estado de Minas