Quatro Estados que concediam incentivos fiscais considerados ilegais pelo Supremo Tribunal Federal em junho driblaram o veto imposto pelo tribunal e continuam assegurando os benefícios a diversas indústrias estabelecidas em seus territórios.

São Paulo, Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul editaram novas leis que anularam ou reduziram o impacto da decisão. O Espírito Santo decidiu não cumprir a determinação judicial e pretende recorrer contra ela, embora a decisão do STF tenha sido unânime.

Na prática, isso significa que as empresas continuam a recolher menos ou nenhum ICMS em operações nesses Estados. Com isso, levam vantagem em relação a concorrentes de outras regiões.

Em junho, o Supremo derrubou de uma vez só 23 normas de sete Estados por considerar ilegais os incentivos que elas criaram.

A decisão deu impulso a negociações entre o governo federal e os Estados para mudar a legislação do ICMS e acabar com a guerra fiscal.

“Isso provocou uma corrida por um perdão amplo e irrestrito dos benefícios”, disse o economista Amir Khair, ex-secretário municipal de Finanças de São Paulo.

Os Estados primeiro tentaram validar os incentivos antigos no Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária), onde se reúnem os secretários da Fazenda de todos os Estados, mas não tiveram sucesso.

São Paulo teve cancelada uma lei que reduzia o ICMS pago pelos fabricantes de leite longa vida. Mas as indústrias não sofreram prejuízo. Desde março está em vigor um decreto que garante desconto no imposto pago pelas indústrias paulistas.

O decreto começou a valer antes mesmo que o Supremo vetasse a lei que beneficiava o setor. “O governo intensificou os benefícios para fazer frente aos incentivos de outros Estados”, disse o presidente do Sindleite, Carlos Humberto de Carvalho. “As fábricas podiam se mudar para outro Estado.”

O medo do êxodo das indústrias beneficiadas pelos incentivos levou Mato Grosso do Sul a reeditar uma lei que teve alguns dispositivos cancelados pelo STF uma semana depois da decisão do tribunal.

“Não houve prejuízo para o setor industrial com a decisão do STF”, informou a Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul, por meio de nota.

Para a tributarista Jerusa Mocelin, criar novas leis é uma “burla” à decisão do Supremo: “Prova que a guerra fiscal não parou”.

No Rio de Janeiro, empresas do setor aéreo continuam comprando querosene de aviação mais barato do que em outros Estados, apesar do veto do Supremo à lei que garante o benefício.

O Estado cobrava 4% de ICMS. No início de julho, um novo decreto fixou alíquota de 12% para o combustível no Rio, ainda abaixo do que outros Estados cobram.

Benefício já foi cancelado, diz SP; Rio não comenta

O Estado de São Paulo afirma que o benefício ao setor leiteiro é “um mecanismo de defesa, não de ataque” e que o Estado defende a neutralidade de incentivos.

“Em 2008, São Paulo teve que conceder benefícios em função de vantagens concedidas noutros Estados, que estavam prejudicando o produtor paulista”, diz o coordenador da Administração Tributária da Secretaria de Fazenda, José Clóvis Cabrera.

Depois disso, outros Estados ampliaram benesses aos fabricantes: “No começo deste ano a situação ficou incontornável e São Paulo teve que rever o beneficio anterior”.

Por isso, segundo Cabrera, o incentivo vetado pelo Supremo já havia sido cancelado antes do julgamento. “O Estado está entrando com informações para dizer ao Supremo que esse beneficio já havia sido revogado”, diz.

A Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro afirmou, por meio de nota, que já “enviou orientação para cumprimento de todas as decisões” do STF. Sobre o novo decreto sobre o preço do querosene de aviação, a assessoria do Estado informou que “não comentará” o assunto.

O Espírito Santo informou, por meio de nota, que vai entrar com recurso, no próprio Supremo, contra a suspensão dos benefícios aos avicultores e suinocultores.

A assessoria do governo de Mato Grosso do Sul afirma que a decisão do Supremo atingiu benefícios que não eram usados desde 2003 e que a edição da nova lei foi feita para validar vantagens antes dessa data, a fim de dar segurança jurídica às empresas: “A decisão do Supremo foi acatada”.

MARIANA CARNEIRO
DE SÃO PAULO