Um futuro comprador do banco Cruzeiro do Sul pode vir a se beneficiar de até R$ 1 bilhão em créditos tributários, segundo documento entregue pelo HSBC e pelo Bank of America Merrill Lynch (BofA) a investidores estrangeiros na sexta-feira. Ambos os bancos foram contratados como coordenadores da recompra dos títulos pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC), entidade de administra o Cruzeiro do Sul desde a intervenção, em 4 de junho.
A notícia trouxe mais ânimo aos detentores de bônus, que enxergaram no crédito fiscal a possibilidade de um eventual comprador elevar o preço pago pelo Cruzeiro do Sul. Esse seria um ativo a mais do banco, já que, se a instituição vier a dar lucro, o crédito tributário pode ser abatido do imposto a ser pago.
O FGC propôs aos investidores nacionais e estrangeiros um desconto médio de 49,3% em seus títulos de renda fixa. Caso eles aceitem essa proposta, o banco poderá ser vendido por um lance mínimo de R$ 1. Se isso não acontecer, o banco será liquidado.
Na avaliação de aplicadores do banco ouvidos pelo Valor, potenciais compradores podem aumentar sua oferta diante da notícia de que existe R$ 1 bilhão em crédito fiscal. Tudo o que exceder R$ 1 será rateado entre os investidores do Cruzeiro do Sul.
A melhora de perspectiva dos aplicadores foi percebida na variação dos preços dos bônus do banco. O valor dos papéis com vencimento em 2015, por exemplo, que vinham sofrendo desvalorização diária nos últimos dias, era negociado por cerca de 44,25% do seu valor de face no fim da sexta-feira. Ao longo da semana passada, até quinta-feira, os papéis eram negociados por volta de 42%.
A sexta-feira também marcou um dia de maior volume de negócios com o bônus com vencimento em 2012. Foram negociados 7,28 milhões de títulos, segundo dados da “Bloomberg”.
“Antes não considerávamos que a proposta de recompra valia a pena. Agora, achamos que é o melhor a se fazer”, diz um operador que negocia os bonds do Cruzeiro. “Diante de uma eventual liquidação, existem os custos de uma querela judicial e perdas maiores com causas trabalhistas. No fim, poderia terminar perto do preço oferecido agora, ou até menor.”
Na interpretação de agentes envolvidos na reestruturação do Cruzeiro do Sul, porém, o crédito tributário não deve ser a questão preponderante a ser analisada por potenciais compradores.
O cálculo feito para se chegar a R$ 1 bilhão de benefício fiscal já excluiu as provisões feitas sobre créditos fictícios, uma vez que fraudes não podem gerar crédito fiscal. Mesmo assim, muitos dos créditos tributários ainda terão de ser discutidos com a Receita Federal, já que alguns deles foram gerados em operações consideradas “heterodoxas” feitas pelo banco. O Cruzeiro do Sul vinha, por exemplo, “sustentando” as cotações da Telebrás desde meados do ano passado, aparentemente numa tentativa de melhorar os resultados divulgados pelo banco.
Há um estoque de R$ 3,3 bilhões em bônus do Cruzeiro no Sul no exterior, 58,1% de todo o passivo do banco. Para que a oferta de compra dos bônus seja bem-sucedida, detentores de pelo menos 90% do valor da dívida terão que aderir à proposta.
Na sexta-feira a agência de classificação de risco Standard & Poor”s (S&P) colocou o Banco Cruzeiro do Sul em observação, que reflete a opinião da agência sobre a potencial direção de um rating com implicações negativas. A ação é aplicável às notas de curto e longo prazos do banco brasileiro, respectivamente classificados em “CC” e “C” na escala global e “brCC” e “brC” na escala nacional.
Para a S&P, mesmo que a proposta de recompra seja bem-sucedida, o banco terá entrado tecnicamente em “default”, dado que o investidor receberá um valor menor do que a promessa dos títulos originais. A agência também levou em consideração o fato de a oferta ser forçada (“distressed”), ou seja, se não for aceita, levará à liquidação do banco.
“Caso o banco seja comprado, vamos iniciar imediatamente o processo de reavaliação da nota da entidade compradora, para considerar os impactos da aquisição”, explica a S&P.
Para a S&P, os problemas restritos ao Cruzeiro não impactam diretamente a nota de outros bancos médios brasileiros.
Por Filipe Pacheco e Carolina Mandl | De São Paulo
Valor Econômico