O Banco Santander vai ter de esperar para ver decidida uma causa de pelo menos R$ 4 bilhões no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, tribunal administrativo do Ministério da Fazenda que julga contestações de contribuintes contra autuações do fisco federal. Nesta quarta-feira (3/8), um pedido de vista interrompeu o julgamento de um recurso do banco contra cobranças da Receita Federal por causa da compra do Banespa, em 2000. Para o fisco, houve aproveitamento indevido de deduções para abatimento de Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.
O relator do caso, conselheiro Antônio José Praga de Souza, auditor da Receita, trouxe seu voto nesta quarta. Ele afastou o argumento do banco de que as cobranças referentes ao ano calendário de 2002 já foram alcançadas pela decadência e não poderiam mais ser exigidas. A 2ª Turma da 4ª Câmara Ordinária da 1ª Seção no Carf seguiu o voto. No entanto, o conselheiro Frederico Augusto Gomes de Alencar, também auditor, pediu vista dos autos. Com isso, o mérito do recurso não foi julgado.
A discussão gira em torno do ágio absorvido nas operações de aquisição de empresas. A Lei 9.532/1997 permite que o valor a mais pago pela compradora por conta da rentabilidade futura do negócio, estimada por quem vende, possa ser deduzido, como despesa, da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
O uso do ágio era tabu até o fim do ano passado, quando o dilema foi julgado também pela 2ª Turma. A decisão, que beneficiou a Diagnósticos da América S/A (Dasa), declarou perfeitamente possível deduzir da base de cálculo dos tributos valores pagos a mais na aquisição de companhias. De acordo com a Lei 9.532, o contribuinte pode parcelar a amortização, a cada mês, à fração de 1/60 do valor do ágio, quando tiver lucro tributável. A Receita pode, no entanto, considerar o aproveitamento ilegítimo.
Foi o que aconteceu com o Santander. Para os auditores da Receita, o aumento do ágio da compra do Banespa ocorreu sem que houvesse contrapartida com fundamento econômico, já que todo ele foi calcado nas previsões de rentabilidade futura. Ou seja, os controladores do Banespa embutiram no preço a rentabilidade que teriam se continuassem no negócio. No entanto, o fisco entende que parte desse valor também se refere a ativos intangíveis, como fundo de comércio — pontos de venda e carteira de clientes, por exemplo —, que não são dedutíveis. Na prática, segundo a Receita, quando comprou o banco estatal, o Santander não poderia ter abatido 100% do ágio, como se ele todo tivesse sido formado pelo valor pago pela rentabilidade futura.
As ações do Banespa em poder da União foram arrematadas pelo Santander por R$ 7 bilhões. O valor sobe para R$ 9 bilhões se somadas as ações compradas de minoritários e empregados. O preço mínimo oferecido no leilão era de R$ 1,8 bilhão. Antes, o governo federal já havia adquirido as ações do estado de São Paulo por R$ 2 bilhões.
Os auditores ainda afirmaram que a mais valia foi construída por meio de uma triangulação de empresas criada apenas para aumentar o ágio. Ou seja, a Santander Holding teria servido apenas como empresa veículo para justificar o ágio, usado para redução do lucro apurado na própria empresa em que o mesmo ágio foi gerado, o Banespa. “Tais fatos evidenciam a simulação de uma operação envolvendo cinco empresas sediadas no Brasil e uma no exterior, com a finalidade de iludir o Fisco, cujo único resultado foi a redução ilícita no lucro do Banespa”, diz relatório do fisco. A Santander Holding foi incorporada pelo Banespa, cuja controladora é a estrangeira Santander Hispano.
Em sustentação oral, o tributarista Roberto Quiroga, sócio do Mattos Filho Advogados, defendeu a legalidade da operação, para a qual a Delegacia de Instituições Financeiras da Receita Federal já havia dado o aval. Segundo ele, o fisco erra ao avaliar o negócio de forma “fatiada”. Ele afirmou que a intangibilidade da marca “Banespa”, cujo valor o fisco exigiu que estivesse dentro do ágio pago, foi explicada contabilmente nos autos. O procurador da Fazenda Nacional Paulo Riscado discordou, afirmando que a empresa quer criar uma “terceira” possibilidade de amortização, já que não teria havido nem venda nem incorporação de investimento na circulação entre as empresas.
Processo 16561.000222/2008-72
Fonte: Conjur