Exemplo usual quando se fala em Classificação Fiscal de Mercadorias, o parafuso revela toda a complexidade por trás desta ciência, conhecida como merceologia. Partindo desta premissa, a seguir serão analisadas algumas questões de interpretação do Sistema Harmonizado de Designação e de Codificação de Mercadorias, essenciais na correta classificação, de um parafuso, inclusive. O texto também abordará as implicações que podem surgir em decorrência de equívocos na identificação de um produto.
Importância da classificação fiscal de mercadorias
Será realmente importante a correta classificação das mercadorias na NCM?
Primeiramente, cabe observar que se trata de uma obrigatoriedade. Conforme prevê o Convênio SINIEF s/nº de 1970, a nota fiscal, modelos 1 e 1-A, deverá conter, dentre outras informações, “o código estabelecido na Nomenclatura Comum do Mercosul/Sistema Harmonizado – NCM/SH, nas operações realizadas por estabelecimento industrial ou a ele equiparado, nos termos da legislação federal, e nas operações de comércio exterior”. Essa mesma obrigatoriedade abrange, também, a Nota Fiscal Eletrônica – NF-e, por força do Ajuste SINIEF nº 7/2005.
A identificação do código da NCM não se restringe, no entanto, às obrigações acessórias, pois ele é essencial na identificação de diversos tributos. Assim é com o IPI (art. 130 do RIPI – Decreto nº 4.544/2002) e com o Imposto sobre Importação (art. 94 do RA – Decreto nº 6.759/2009). Em relação ao PIS/PASEP e à COFINS, a utilização dessa codificação vem se ampliando, e tem sido fundamental na identificação de benefícios fiscais, regimes especiais e tributações diferenciadas.
Quanto ao ICMS, o conhecimento da exata classificação também tem sido essencial. Além de benefícios fiscais, os códigos da NCM são utilizados para fixar quais produtos estão abrangidos pela substituição tributária.
O enquadramento incorreto na NCM pode levar tanto ao recolhimento a maior, quanto a menor de tributos. Nesta última hipótese, a multa mínima por lançamento de ofício é de 75% (Art. 44 da Lei nº 9.430/96).
No âmbito do comércio exterior, ainda há previsão de multa de 1% sobre o valor aduaneiro da mercadoria classificada incorretamente (art. 711 do RA).
Sem o código da NCM, ainda se torna impossível prosseguir com os procedimentos administrativos para uma importação. Destaca-se que no caso de embarque de mercadoria sem a respectiva licença de importação, a multa prevista é de 30% do valor aduaneiro (art. 706 do RA).
A estrutura do Sistema Harmonizado – HS
Para facilitar as relações internacionais, foi estabelecida uma padronização para classificação de mercadorias. Essa padronização é conhecida como Sistema Harmonizado – HS e é adotada por 177 países, nos quais se incluem os países do Mercosul.
O HS é composto por um sistema de códigos com 6 dígitos, divididos em 21 seções e 97 capítulos. No âmbito do Mercosul, no entanto, esse sistema sofreu algumas alterações com a aprovação da Nomenclatura Comum do Mercosul. Basicamente, aos 6 dígitos HS foram acrescidos mais 2.
No Mercosul, portanto, os produtos estão classificados com base na NCM, que possui 8 dígitos. É este código que deve ser utilizado para identificação dos tributos incidentes sobre determinado produto.
Regras de interpretação do Sistema Harmonizado
Para permitir a correta identificação de um código da NCM, se faz necessário conhecer as notas explicativas do sistema harmonizado de designação e de codificação de mercadorias, mais conhecidas por NESH.
Sendo assim, para identificar a classificação de um determinado produto, além de conhecer a relação dos códigos da NCM, que se encontram detalhados na TEC (Resolução CAMEX nº 43/2006) e na TIPI (Decreto nº 6.006/2006), ainda se faz necessário conhecer a NESH (Instrução Normativa RFB nº 807/2008).
Esse documento traz seis regras que são aplicadas a todos os códigos. Nestas regras estão descritos, por exemplo, os critérios que foram adotados para sistematização dos códigos na NCM.
Também é estabelecido que naquelas hipóteses em que pareça que uma mercadoria possa classificar-se em duas ou mais posições, a classificação deve efetuar-se considerando a posição mais específica sobre as mais genéricas.
Sobre este ponto específico, a NESH ainda prevê que uma posição que designa nominalmente um artigo em particular é mais específica que uma posição que compreenda uma família de artigos.
Além dessas regras gerais, ainda é fundamental conhecer as notas que constam de cada seção, capítulo, posição e subposição. Nelas iremos encontrar, por exemplo, situações que não se enquadram nesses respectivos grupos.
A classificação do parafuso
Utilizando algum sistema de busca na TIPI ou na TEC com a palavra “parafuso”, teremos como retorno 9 códigos que mencionam esse termo. Desses, cita-se como exemplo, o código 7318.14.00, cuja descrição é “Parafusos perfurantes”. Poderíamos simplesmente utilizar esse código? E se optássemos pelo código 7318.12.00, o qual tem por posição “Outros parafusos para madeira”?
Tendo em vista que nosso parafuso não é perfurante e nem será usado em madeira, não parece que essas classificações sejam as mais adequadas. Portanto, precisamos conhecer um pouco mais o nosso produto, e neste sentido iremos verificar que se trata de um parafuso a ser utilizado em aeronaves. Poderíamos então utilizar um código mais genérico, o 3926.90.90, cuja descrição é “Parafusos e porcas”.
Mas se este parafuso será utilizado em aeronaves, não seria o caso de analisar o capítulo 88, que trata das aeronaves, aparelhos espaciais e suas partes? Afinal, o parafuso não será uma parte da aeronave? Neste capítulo não encontraremos especificamente o parafuso, mas temos o código 8803.30.00, cuja descrição é “Outras partes de aviões ou de helicópteros”.
Aparentemente, nada proibiria de utilizar essa classificação, no entanto, analisando a NESH, encontraremos que este capítulo compreende as partes e acessórios reconhecíveis como exclusiva ou principalmente destinados aos veículos que engloba. Esse não é o caso de nosso parafuso, que também serve para outras finalidades.
Talvez seja melhor voltarmos então ao parafuso do código 3926.90.90, que é mais genérico. No entanto, estaríamos errados, pois esse produto não é composto do mesmo material do nosso parafuso, que é feito de alumínio. Assim, tendo em vista sua composição, iremos verificar que o alumínio e suas obras constam do capítulo 76 e o nosso parafuso, mais precisamente, no código 7616.10.00, que abrange “tachas, pregos, escápulas, parafusos, pinos ou pernos roscados, porcas, ganchos roscados, rebites, chavetas, cavilhas, contrapinos, arruelas e artefatos semelhantes”.
Considerações finais
A classificação fiscal de mercadorias é ciência complexa, com muitas nuances. Em face de todas as regras aplicáveis, as possibilidades de se cometer erros são muito grandes.
Na classificação de um simples parafuso é necessário verificar inúmeras regras de classificação, e sua inobservância pode levar o contribuinte a sérios prejuízos. Em relação ao IPI, por exemplo, em nossa pesquisa retornaram produtos com alíquota de 0% e 10%. Quanto ao II, foram relacionadas alíquotas de 14%, 16% e 18%. Isso comprova a importância de uma correta classificação, pois esses erros poderiam levar ao recolhimento incorreto de tributos.
Por fim, cabe ressaltar que se na simples classificação de um parafuso podem surgir tantas dúvidas, o que poderá surgir em relação a produtos mais complexos, como máquinas e equipamentos, produtos químicos, medicamentos, kits de produtos etc.
Fonte: Fabio Rodrigues de Oliveira – www.fiscosoft.com.br