Cresce o número de fornecedores obrigados a emitir NF-e. Contratantes que não checarem a conformidade de seus prestadores poderão ser autuados. Saiba como agir
Desde 1o de julho, empresas de 68 categorias da CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) passaram a ser obrigadas a emitir a NF-e (Nota Fiscal Eletrônica). Dessas, pelo menos dez relacionam-se diretamente com o setor da construção civil. Outras 22, pelo menos, podem ter relação com algumas atividades de construção. De acordo com o cronograma do SPED (Sistema Público de Escrituração Digital), mais 288 atividades passarão a ser consideradas até 1o de dezembro deste ano, sendo 249 já a partir de 1o de outubro próximo. Na opinião de Tânia Gurgel, consultora tributária e sócia da TAF Consultoria Empresarial, a quantidade de empresas obrigadas a emitir NF-e deve aumentar. O problema, para ela, é que boa parte das empresas da construção não têm nem consciência de que novos procedimentos são necessários também ao receber produtos de fornecedores obrigados a emitir essas notas. Em entrevista em seu escritório, na zona Sul de São Paulo, Tânia mencionou que até as próprias secretarias da Fazenda dos Estados têm ciência que muitas empresas obrigadas a emitir a NF-e ainda não o estão fazendo. Ela também apresentou o resultado de pesquisa realizada em 2009 pela IOB Soluções que considerou amostragem de 405 empresas com faturamento anual entre R$ 3 milhões e R$ 7 bilhões.
Para a pesquisa, foram consideradas 3,2 milhões de notas fiscais, cuja análise embasa o argumento de que várias empresas cometeram erros ao emitir a NFe, sendo que os principais estavam atrelados à composição da base de cálculo do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Houve também problemas de débitos de ICMS devido à alíquota divergente entre a NF (Nota Fiscal) e o cadastro do produto. Por fim, dentre outros, foram também identificados registros fiscais com problemas nas saídas interestaduais para não contribuintes com alíquotas diferentes das previstas na legislação de ICMS e falta de preenchimento do NCM (Tipi) do produto. Nesta entrevista, Tânia Gurgel fala sobre os riscos a que estão sujeitas as empresas devido ao desconhecimento da entrada de fornecedores no rol das obrigadas a emitir NF-e.
Com a obrigatoriedade da emissão de NF-e por parte das empresas fornecedoras, o comprador da construção civil deve se preocupar com o quê?
O comprador deve verificar quais dos seus fornecedores estão obrigados a emitir NF-e. Essa consulta pode ser feita eletronicamente no site da Receita, no link “Empresa”, “Cadastro – CNPJ”, “Emissão de Comprovante de Inscrição e de Situação Cadastral”. Ali, ele digita o CNPJ do fornecedor e analisa as atividades cadastradas no CNAE, pois é por meio desse código que o Fisco atribui a obrigatoriedade às empresas. Há um cuidado adicional nessa pesquisa, pois deve ser considerada não só a atividade principal, mas as secundárias. Por isso, é recomendável observar se as atividades indicadas estão de acordo com o contrato social. Ou seja, se o objeto da empresa está igual ao CNAE, porque pode ser que o CNAE não obrigue a emissão de NF-e, mas o contrato sim. Por exemplo, se a razão social contiver a atividade de fabricação ou importação, a empresa estaria obrigada desde 2008. Descobrindo o CNAE do fornecedor deve ser acessado o site da Secretaria da Fazenda para verificar desde quando existe a obrigação de emitir a NF-e. Em São Paulo, a consulta é feita em www.fazenda.sp.gov.br/nfe.
Como fica a conferência em canteiro?
Sugiro ao departamento de compras posicionar o departamento fiscal sobre a compra de determinado fornecedor para que seja feita a checagem prévia. Agora, quando a mercadoria é entregue diretamente no canteiro, é preciso verificar, antes de qualquer outro movimento, se o DANFE (Documento Auxiliar da Nota Fiscal Eletrônica), que acompanhou a mercadoria até o destino, foi autorizado pelo Fisco. Essa conferência é de vital importância, podendo ser feita por meio do site da Secretaria da Fazenda do Estado. Para tanto, é preciso inserir o código que consta no Danfe, que é a chave de acesso, pois se a NF-e não está autorizada, a mercadoria não pode sequer ser recebida. Outro dado importante é a guarda da prova da consulta no ato do recebimento. Não se deve autorizar o descarregamento do caminhão até fazer essa conferência.
Por quê?
Porque a empresa fornecedora pode ter cancelado aquele Danfe, e com isso não ter gerado a NF-e, ou mesmo o Fisco pode não ter autorizado sua emissão. Assim, é necessário ter a prova de que, no momento do recebimento, a NF-e existia e estava autorizada no arquivo do Fisco. Também é preciso atentar para o fato de que o Danfe não é a NF-e, pois essa é encaminhada por e-mail em arquivo eletrônico em formato XML pelo vendedor à empresa.
Por quanto tempo é necessário guardar esses arquivos XML?
Por cinco anos, pois essa é a nota fiscal que a fiscalização vai pedir. E a obrigação de guardar é do contribuinte. Recomendo que os empresários levantem todos os Danfes recebidos desde 2008 e verifiquem se há os arquivos XML. Caso acusem falta de algum, que solicitem aos fornecedores o reenvio dos respectivos arquivos XML, além de efetuar backup dessas informações.
Fazendo todas essas conferências, significa que a nota está correta?
Não, esse processo não checa os detalhes fiscais, tais como alíquota e valor do ICMS, base de cálculo, se há substituição tributária para o produto, se o código do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) ou o dispositivo legal estão preenchidos adequadamente. Um erro muito frequente é o não preenchimento dos dados relativos ao transporte, bem como do peso bruto e líquido, falta de NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul) da mercadoria. É importante mencionar que esses erros acontecem porque muitas empresas utilizam o sistema de emissão de NF-e fornecido gratuitamente pela Secretaria da Fazenda, que aceita a digitação manual do usuário sem nenhuma validação dos campos tributários ou mesmo consistência de valores com relação às regras tributárias.
Se os procedimentos de recebimentos não checam todos os detalhes, o que pode ser feito?
Recomendo primeiramente uma análise minuciosa dos dados das notas fiscais, porque uma vez que o envio é eletrônico, o Fisco já tem em sua base essa ocorrência. Caso encontre divergência ou erros procure corrigi-los espontaneamente antes de uma autuação. Outro ponto é realizar um trabalho preventivo, consultando toda a base de dados de informações, principalmente de seus fornecedores, identificando quais estão obrigados a emitir NF-e, verificando se todas as notas fiscais que entraram foram emitidas conforme as exigências, bem como realizar revisão detalhada das regras tributárias de tais notas. Também recomendo fazer uma revisão constante do próprio cadastro interno, verificando se os campos que se têm preenchido nas notas são compatíveis com os exigidos nas normas legais. A revisão é importante porque as empresas são obrigadas a mandar os livros fiscais e eletrônicos e, com isso, o Fisco consegue ver compras de empresas não habilitadas ou mesmo de empresas que devem estar emitindo NFe e não o fizeram ainda.
Ainda assim, o que fazer caso algo nesse processo todo não tenha sido cumprido?
Tem que ser feita uma denúncia espontânea no posto fiscal ao qual está vinculada a empresa, evitando multa ainda maior. Afinal, além da multa de 50% sobre o valor da operação ou da prestação de serviços no caso de NFe, há correção baseada na taxa Selic sobre o imposto ou tributo devido na operação. Como o Fisco tem cinco anos para autuar, a multa pode ser acrescida de cerca de outros 50%, considerando a taxa atual anual da Selic, que é de 10,75%.
E caso isso ocorra não é possível acionar o fornecedor judicialmente, uma vez que o erro foi dele?
Não, porque quem agiu com negligência, imprudência ou imperícia foi a empresa que não conferiu o que a lei determina. Porém, isso não quer dizer que o fornecedor também não seja autuado pelo Fisco, pois geralmente os dois lados acabam sendo penalizados. Afinal, o Fisco considera suficiente disponibilizar a consulta legislativa gratuita em seu site e no diário oficial. Infelizmente, a construtora será punida por não ter sido prudente e ter feito um trabalho preventivo.
Outras pessoas podem ser responsabilizadas?
Aquele que insere elementos inexatos em documento exigido pela lei fiscal – em constatação feita pelo Fisco Estadual em auditoria – frauda a fiscalização tributária e, portanto, comete o crime previsto no artigo 1o, inciso II, da lei 8.137/90, podendo, a depender do caso, ser responsabilizados os administradores, sócios e representantes legais da empresa. O contador também pode ser responsabilizado.
Uma vez que a obrigatoriedade da NF-e iniciou em dezembro de 2008, a construtora tem que fazer uma consulta retroativa?
Ela tem que rever sua base de compras, consultando se os fornecedores dos quais comprou itens estavam ou não inscritos no CNAE no momento da compra.
Fonte: http://revista.construcaomercado.com.br/guia/habitacao-financiamento-imobiliario/111/artigo186606-1.asp
Entrevista concedida ao Jornalista Bruno Loturco