SÃO PAULO – A Receita Federal vem apresentando divergências em processos de valoração aduaneira, quando há dúvidas em relação ao preço declarado na importação. Em casos semelhantes, a decisão do fisco tem sido a de caracterizar a diferença do valor aduaneiro como fraude, ou ainda, questionar o preço da transação.
Na prática, segundo Felippe Breda, advogado especialista da área aduaneira do escritório Emerenciano, Baggio e Associados – Advogados, a Receita não tem seguido as formas de apuração de valor e já vem entendendo que houve fraude, o que ocasiona o perdimento da mercadoria. “Nenhum dos casos que temos no escritório foi comprovada a fraude do contribuinte, mas mera presunção de que o preço que a Receita entende como correto determina a caracterização da fraude”, conclui Breda.
Para o advogado, “como o processo de valoração aduaneira é complexo, a Receita passa a adotar um caminho mais fácil”.
Segundo ele, em dois casos idênticos com escritório, com acusações iguais de divergências no preço, tiveram desfecho diferente. Em um deles, houve a cobrança da diferença de tributos e multa de 100%. No outro, houve o perdimento da mercadoria por documento falso.
No Brasil, para que a mercadoria seja desembaraçada, o importador deve fazer a declaração do valor aduaneiro – o preço da mercadoria e demais despesas, como transporte ou seguro de carga. O fisco pode não concordar com a declaração de duas formas: dizendo que não concorda com o valor da transação, pois outros elementos deveriam ser inseridos, ou que houve fraude por parte do contribuinte.
Hoje, segundo Breda, o fisco ao discordar do valor tem declarado que há fraude e falsidade ideológica, acarretando o perdimento da mercadoria. “Uma diferença de preço é tratada como uma infração mais grave”, afirma.
A empresa apresenta os documentos e toda a negociação com o exportador provando que o preço da mercadoria foi o declarado, mas a Receita afirma ter dúvidas e coloca a empresa em procedimento especial de fiscalização. Baseado no artigo 88 da MP 2.158-35/2001, pede um laudo unilateral. “Não há participação do contribuinte, ele só fornece os dados. Não há contraditório”, explica Breda.
A partir daí, há duas consequências: o perdimento das mercadorias por considerar que os documentos necessários ao desembaraço eram falsos ou a multa de 100% da diferença do tributo. “Se o fisco entende que o valor não é o correto, deveria cobrar a diferença sem o bloqueio da mercadoria. Com isso, deve ser pago valor para a liberação ou entrar com medida judicial. Caso contrário, ela fica retida e a tributação não pode ser usada como impeditivo para liberação da mercadoria”, afirma.
No caso de perdimento, a empresa é chamada para em 20 dias apresentar sua defesa. “Mas ela é julgada pela mesma fiscalização que determinou o bloqueio, ou seja, a chance de sucesso no recurso é baixa”, diz Breda. O próximo passo é procurar o Judiciário.
De acordo com o advogado, na Justiça é necessário o depósito de uma garantia para liberar a mercadoria, da diferença de tributo discutida. “Enquanto isso, o patrimônio da empresa é desfalcado e ela fica sem mercadoria. A diferença de tributo deve pesar no bolso e não no patrimônio”, completa o advogado.
Ele afirma que a Receita não leva em conta os documentos da transação que mostram que a operação pode ter sido feita abaixo do preço de custo. “As empresas seguem a regra de mercado e desovam os produtos para não ter prejuízo”, destaca.
Andréia Henriques
DCI