A questão que envolve o reconhecimento de receita das incorporadoras imobiliárias no Brasil deve ser definitivamente resolvida com o novo pronunciamento que o Conselho de Normas Internacionais de Contabilidade (Iasb, na sigla em inglês) pretende publicar até o início do segundo semestre. O “definitivamente” deve ser lido com cuidado, já que a polêmica entre empresas e auditores sobre o tema é grande.

Mas se nada mudar até o texto final ser publicado, as empresas seguirão com a possibilidade de contabilizar a receita de imóveis vendidos em construção conforme o andamento da obra, pelo método conhecido como “percentage of completion” (POC), e não apenas na entrega das chaves.

Conforme apresentação feita ontem na Conferência IFRS, realizada em São Paulo, a versão mais recente da norma que trata do assunto traz três critérios para permitir que a receita seja reconhecida ao longo do período de execução de um contrato, sendo que basta que um deles seja atendido.

Em um dos critérios, o Iasb diz que a receita deve ser contabilizada ao longo do tempo se: o trabalho realizado pela vendedora não cria um ativo com uso alternativo para a entidade, se ela tiver direito a receber pela obrigação cumprida até aquela data e se ela espera cumprir o contrato conforme prometido. “Entendo que esse ponto é aplicável para incorporação imobiliária”, disse Allison McManus, diretora técnica do Iasb.

No Brasil, como em outros países, se a incorporadora vende para um cliente o apartamento 71B, por exemplo, ela não pode vender a mesma unidade para outro comprador. Ela portanto, não teria um uso alternativo para aquele ativo. E isso é diferente de quando se compra um imóvel com características genéricas.

Da mesma forma, embora isso seja raro, se uma incorporadora quiser repassar a conclusão de um empreendimento para outra empresa, a primeira companhia tem direito a receber pelo serviço prestado até determinada data.

Assim, embora o Iasb não se pronuncie sobre o enquadramento ou não de uma norma a um determinado contrato de um país específico (deixando o julgamento para as empresas), o entendimento dos especialistas é de que o caso das incorporadoras será resolvido, no interesse das companhias, que preferem manter o sistema atual.

O uso do método POC pelas empresas do setor tem chamado a atenção dos investidores principalmente pelos enormes estouros de orçamento que têm sido identificados, provocando estornos bilionários de receita.

Na visão de Thomas de Mello e Souza, sócio da gestora Gávea Investimentos, há muita “inconsistência e volatilidade” nos balanços dessas empresas, o que acaba dificultando a vida do investidor.

De acordo com José Carlos Bezerra, superintendente de normas contábeis da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), entretanto, os problemas tem mais a ver com “idiossincrasias” do setor imobiliário do que com uma má aplicação do conjunto de normas.

Entre elas está o prazo longo de execução dos contratos e o reconhecimento da receita com base no custo orçado, que nem sempre é bem controlado.

Por Fernando Torres | De São Paulo