O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a tramitação de mais de 500 recursos discutindo, na própria Corte, se as ações para pleitear o pagamento de FGTS envolvem um período retroativo de 30 ou cinco anos. Os ministros decidiram aguardar o julgamento de um leading case que começou a ser analisado em agosto, de uma funcionária pública contra o Estado do Rio Grande do Norte. Até o momento, dois ministros votaram em sentido contrário à jurisprudência atual: entenderam que as discussões do FGTS só podem abranger cinco anos antes do ingresso da ação.

O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, entendeu que a prescrição de três décadas deve ser substituída pela prevista no artigo 29, inciso 7º, da Constituição, que fixa um prazo de cinco anos para a discussão de créditos resultantes das relações de trabalho. O voto foi acompanhado pela ministra Ellen Gracie, hoje aposentada. O julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro Carlos Ayres Britto.

Os votos chamaram a atenção de empresas e trabalhadores, pois podem impactar milhares de processos no país inteiro, definindo se haverá ou não mudança no prazo de prescrição do FGTS.

Após o término de um contrato de trabalho, os empregados têm dois anos para entrar na Justiça contra a empresa, discutindo o pagamento de valores. Essas ações podem requerer verbas retroativas a cinco anos. Mas no caso do FGTS, uma lei amplia o prazo para 30. As empresas sustentam que essa lei é inconstitucional.

O motivo de discórdia é uma aparente contradição entre a Constituição e a lei do FGTS. O artigo 7º da Constituição estabelece, no inciso 29, que a discussão de verbas “resultantes das relações de trabalho” diz respeito aos últimos cinco anos. Já a Lei nº 8.036, de 1990, define que as ações sobre FGTS podem retroagir por 30 anos.

“A discussão é se os créditos do FGTS têm ou não natureza trabalhista pura”, diz o advogado Daniel Chiode, do escritório Demarest & Almeida Advogados, que já teve cerca de dez casos suspensos no STF para aguardar o julgamento do leading case. De acordo com ele, o resultado terá impacto considerável no método de apuração de riscos contenciosos pelas empresas. Atualmente, a análise de possíveis desembolsos de verbas trabalhistas retroage por cinco anos, enquanto o FGTS é contabilizado de forma separada, por englobar um prazo mais alongado.

A jurisprudência atual é pacífica em definir os 30 anos. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) editou a Súmula nº 362 fixando esse prazo, e o STF já se posicionou da mesma forma. O entendimento é que, como o FGTS tem natureza social (e não apenas trabalhista), pode ter prescrição própria. Mas, em agosto, o ministro Gilmar Mendes afirmou que a jurisprudência é anterior à Constituição e deve ser revista.

Para o advogado Carlos Eduardo Viana Cardoso, do Siqueira Castro Advogados, a maioria das ações judiciais mais recentes não seria afetada pela decisão. “Hoje, o mais comum é ter contratos de trabalho com duração menor”, afirma. Mas, para ele, a prescrição de cinco anos traria maior segurança jurídica para as empresas. A advogada Monya Tavares, do escritório Alino & Roberto e Advogados, especialista na defesa de trabalhadores, diz que uma eventual mudança de jurisprudência “reduziria consideravelmente o direito de pleitear o FGTS quando o depósito não foi feito”.

Maíra Magro – De Brasília