I – Introdução
A alta carga tributária numa espiral crescente pós CF/1988 aliado aos altos custos para a gestão dos tributos vigente em nosso país levam alguns contribuintes menos avisados a tentar minimizar seus custos com os números tributos e contribuintes através de omissões que culminam na sonegação fiscal, apesar de incorrer em crime tributário.
Nosso País tem o custo de gestão fiscal mais alto do planeta e também se inclui no topo da pirâmide da quantidade de tributos e/ou contribuintes que incidem sobre a vida dos contribuintes, sejam pessoas físicas ou jurídicas (1).
Com a evolução tecnológica foi possível aos Governos (Federal, Estaduais e Municipais) implantarem os chamados cruzamentos eletrônicos de dados como meio mais eficaz e rápido de se conhecer possíveis sonegações ocorridas nas transações comerciais ocorridas em todo o território nacional.
A evolução da carga tributária pós CF/1988:
1989 – 20% do PIB foram tributados.
1996 – 25% do PIB foram para o erário.
2003 – 32% do PIB foram destinados aos tributos.
2007 – 36% do PIB foram tributados, o que deixa claro que o sistema tributário nacional criado pela Ditadura Militar (e mantido pelos Governos ditos democráticos – PMDB, PSDB, PT, todos governaram com projeto de poder e não com projeto de nação) precisa ser radicalmente repensado e reformulado, para se adequar aos princípios democráticos garantidos pela Carta Política de 1988. A alta carta tributária é um dos gargalos que impedem o crescimento do País!
II – Alguns tipos de cruzamentos mais comuns
Em artigo anterior já havíamos abordado os casos mais comuns de cruzamentos eletrônicos de dados que, facilmente, dá ao Fisco informações mais que suficientes para concluir que o contribuinte sonegou impostos e/ou contribuições ou omitiu declarações que são passíveis de denúncia por crime contra a ordem tributária. Veja-se parte de nosso texto anterior:
“Atualmente, com as declarações digitalizadas (DCTF, DACON, GEFIP) e on-line (SPED, NF-e) no ágil ritmo da informática, é inconcebível que os contribuintes sejam obrigados a esperar cinco anos para ter certeza de que sua conduta fiscal foi correta.
Ora, os contribuintes são obrigados a informar os fatos geradores das obrigações tributárias através do cipoal de declarações on-line – algumas até repetitivas, como a DCTF e DACON, e são coagidos a fazê-lo sob pena de pesadas multas e abertura de processos criminais, em caso de constatação de omissões ou irregularidades. Basta conferir o grande número de processos em tramitação, versando sobre CRIMES TRIBUTÁRIOS, tendo como réus empresários, advogados, contadores, padres e pastores evangélicos (enquanto responsáveis pelas escolas mantidas pelas igrejas) e diretores de ONG’s, justamente por desconhecerem as inúmeras obrigações a que lhes são impostas a cumprir.
É fácil comprovar a falta de informação das pessoas que estão submetidas à humilhação de enfrentar o trâmite do processo criminal, tendo em vista o elevado número de acessos em artigo por nós publicado, ainda em 2008, sobre “obrigações tributárias do terceiro setor”, sendo o mais acessado em vários portais e sites do ramo, dentre todos os artigos de nossa autoria.
E mais: Com a implantação da Nota Fiscal Eletrônica e do Sistema Público de Escrituração Digital, o Fisco dispõe de todos os dados necessários para tomar conhecimento dos fatos geradores e promover os lançamentos tributários em tempo real. Por isso somos favoráveis que, além de REDUZIR de CINCO para DOIS ANOS o prazo de DECADÊNCIA TRIBUTÁRIA, que sejam EXTINTAS as várias DECLARAÇÕES eletrônicas existentes como obrigações acessórias, por se tornarem desnecessárias, tanto pela existência das NF-e como pelo SPED Contábil e Fiscal.
Pois bem. De posse das várias declarações on-line enviadas pelos contribuintes, o Fisco promove os cruzamentos que lhe aprouver, visando encontrar indícios de sonegação e, diante de possíveis ocorrências, expedem-se os cabíveis autos de infração. Como os cruzamentos são feitos pelos poderosos computadores do Sistema de Arrecadação, o prazo de dois anos é mais do que suficiente para dar por encerrado a fase de homologação dos lançamentos promovidos pelos contribuintes.
Existem vários CRUZAMENTOS ELETRÔNICOS promovidos pela RFB, visando apurar omissões de receitas. Dentre tantos, vejam-se alguns dos possíveis cruzamentos:
1- DCTF x DIPJ: confronto dos débitos informados na DCTF com as informações da DIPJ
2 – DCTF x DACON: confronto dos débitos informados na DCTF com as informações do DACON
3 – DCTF x DIRF: confronto dos débitos informados na DCTF com as informações do DIRF
4 – DCTF x DCOMP: confronto dos débitos informados na DCTF e vinculações com créditos compensados na DCOMP
5 – DCOMP x DIPJ: confronto dos créditos informados na DCOMP com as fichas da DIPJ
6 – DCOMP x DCTF x DIPJ: confronto dos créditos informados no DCOMP com valores informados na DCTF e DIPJ
7 – DIRF x DIPJ: confronto dos valores retidos informados na DIRF com as fichas da DIPJ
8 – DCTF x DARF: confronto dos débitos informados na DCTF com as informações do DARF
9 – DCOMP x DARF: confronto dos créditos informados na DCOMP com as in formações do DARF
10 – Outros Cruzamentos: DCOMP x DACON; DARF + DCOMP = DCTF; DCTF + DIRF = DIPJ.
Além desses, todo o Fisco dispõe de acesso ao Sistema Financeiro, com a Quebra do SIGILO FISCAL, em desrespeitos aos vários preceitos de Garantais Constitucionais constantes da Carta Magna de 1988. Não bastasse tantas facilidades, ainda há o envio on-line pelos comerciantes, das informações a respeito das operações com a utilização dos cartões de débitos e créditos pelos consumidores/contribuintes, uma vez que as MÁQUINAS onde são inseridos os cartões para concretizarem as operações dos respectivos pagamentos estão conectadas simultaneamente às operadores dos cartões e aos Fiscos Estaduais.”
Com o SPED contábil e todos os possíveis cruzamentos existentes e, ainda, a partir das declarações eletrônicas dos próprios contribuintes não é preciso esperar pelas entregas das Declarações de Ajustes Anuais (DIRF, DIPF e DIPJ) para que a própria RFB tenha conhecimento de todas as operações praticadas pelos contribuintes para que saiba quem está sonegando. Estamos na era do “Big Brother” fiscal.
Portanto, não vale à pena correr riscos, pois certamente o Fisco agirá com rapidez inimaginável ao cidadão comum.
III – A quebra dos sigilos pela justiça
A quebra dos sigilos bancários e fiscal dos contribuintes, embora o STF tenha ultimamente decidido pró-contribuinte, é arma bastante utilizada pelo poder tributante para saciar sua ganância arrecadatória.
A guisa de informação veja-se um despacho exarado pelo Juiz da 5ª Vara da Justiça Federal, Seção de MG, em processo (2) versando sobre improbidade administrativa, para que o leitor possa tomar conhecimento de como são incisivos os atos judiciais quando se tem indício de ato criminoso praticado pelo cidadão, verbis:
“2. Com estes fundamentos, rejeito a defesa preliminar apresentada e, por conseqüência, recebo a petição inicial da presente ação de improbidade administrativa e determino a citação de ADEMIR LUCAS GOMES nos exatos termos do parágrafo 9º, do art. 17, da Lei 8429/92, para vir apresentar defesa no prazo legal.
3. Quanto o pedido de quebra dos sigilos bancário e fiscal, diante dos esclarecimentos prestados às fls. 73/75, com base no art. 1º, § 4º da Lei Complementar n. 105/2001, e art. 198, § 1º, II do CTN, com a redação dada pela Lei Complementar n. 104/2001, e, mais, tendo em vista que há, nos autos e no Procedimento Administrativo em apenso, fortes indícios de atos de improbidade administrativa imputáveis ao requerido, defiro o pedido de fls. 44/48, para o fim de quebra dos sigilos fiscal e bancário de Ademir Lucas Gomes. Nesse sentid o, a jurisprudência vem decidindo. Confira-se: (…). Determino, assim, a intimação da Secretaria da Receita Federal para remessa a este Juízo, no prazo de 10 (dez) dias, de: a) cópia da declaração de ajuste anual do requerido, Ademir Lucas Gomes, CPF n. 071.661.096-53, relativa ao ano de 2009 (ano-base 2008); b) cópia completa dos Dossiês Integrados do requerido, Ademir Lucas Gomes, CPF n. 071.661.096-53, em papel e meio eletrônico, do último ano, que deverão conter, entre outras, as seguintes informações: Extrato DW, Cadastro CPF, Ação Fiscal, CADIN, CC5 Entradas, CC5 Saídas, CNPJ, Coleta, Conta Corrente PF, Compras DIPI Terceiros, DCPMF, DERC, DIMOB, DIRF, DIRPF, DOI, ITR, Rendimentos DIPJ, Rendimentos Recebidos PF, SIAFI, SINAL, SIPADE, Vendas DIPJ Terceiros. Determino, ainda, a intimação do Banco Central do Brasil, para encaminhar todos os dados disponíveis no Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS), no prazo de 10 (dez) dias, em ar quivo magnético, no formato Access, devidamente tabulado, referente à pessoa física do requerido nestes autos. Determino, também, a intimação do Banco Central do Brasil para que solicite às instituições financeiras apresentação de toda a movimentação financeira do requerido no prazo de 30 (trinta) dias, bem assim o envio em meio magnético dos extratos de todas as operações financeiras mencionadas no § 1º do art. 5º da Lei Complementar n. 105/2001, em especial de todas as contas bancárias, aplicações de qualquer tipo, investimentos em bolsas de valores e mercadorias e futuros, custódia de títulos mobiliários, aquisição de moeda estrangeira, conversões de moeda estrangeira em nacional. Vindo aos autos as informações supra requeridas, estes passarão a tramitar sob Segredo de Justiça. (negrito nosso).
4. Com as respostas aos itens supra, vista ao MPF.
Publicado em 17/08/2010 no e-DJF-1
Certificado da publicação em 17/08/2010 às 0 9:08:53 179 INTIMACAO / NOTIFICACAO PELA IMPRENSA: PUBLICADO DECISAO”
Logicamente que, com o passar dos meses após a dura decisão prolatada nos autos, o RÉU naqueles autos já conseguiu algumas liberações de bens anteriormente bloqueados, uma vez que é bem defendido por advogados especialistas no ramo. Mas nem todo cidadão tem condições econômico-financeira para contratar bons defensores, sendo mais um motivo para evitar a sonegação.
IV – Alteração da legislação trouxe insegurança para quem pratica crime tributário
Apesar da existência da Súmula Vinculante nº 24 do STF, que contempla a impossibilidade de abertura de processo criminal pela ausência de constituição definitiva do crédito tributário, que impede a persecução penal dos crimes materiais contra a ordem tributária, não é seguro ao contribuinte contar com certezas de que as decisões administrativas, decorrentes de suas impugnações ou recursos aos colegiados administrativos (CARF, por exemplo), lhes serão favoráveis e evitará a constituição definitiva do crédito tributário, condição indispensável para a denúncia criminal.
Eis o teor da SV 24/STF:
“Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, I a IV, da Lei 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.”
Para os mais estudiosos e os curiosos vale conferir os debates ocorridos quando da votação do Projeto de Súmula Vinculante que originou a decisão da Excelsa Corte. (3)
Em 2011 foi promulgada Lei (4) que alterou substancialmente o andamento do processo criminal por sonegação fiscal. Antes das alterações inseridas na citada Lei 12.382/2011 (com duvidosa constitucionalidade, que não abordaremos aqui), bastava o contribuinte réu em processo por crime tributário parcelar o débito que originou a denúncia criminal para que obtivesse a suspensão do andamento do processo, enquanto adimplente na quitação das referidas parcelas, com a extinção da pretensão punitiva do estado quando da quitação final do financiamento.
Pois bem. A NOVA LEI foi incisiva, verbis:
“Art. 6º O art. 83 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescido dos seguintes §§ 1º a 5º, renumerando-se o atual parágrafo único para § 6º:
“Art. 83. (… )
§ 1º Na hipótese de concessão de parcelamento do crédito tributário, a representação fiscal para fins penais somente será encaminhada ao Ministério Público após a exclusão da pessoa física ou jurídica do parcelamento.
§ 2º É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes previstos no caput, durante o período em que a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes do recebimento da denúncia criminal. (negrito nosso).
§ 3º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.
§ 4º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento.
§ 5º O disposto nos §§ 1º a 4º não se aplica nas hipóteses de vedação legal de parcelamento.
§ 6º As disposições contidas no caput do art. 34 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, aplicam-se aos processos administrativos e aos inquéritos e processos em curso, desde que não recebida a denúncia pelo juiz.
Art. 7º Esta Lei entra em vigor no primeiro dia do mês subseqüente à data de sua publicação.”
Portanto, os parcelamentos tributários concedidos a partir de 1º de março de 2011 não mais servirão para suspender o curso do processo criminal, não trazendo nenhuma conseqüência benéfica no andamento da ação penal.
Não somente é injusto o novo texto legal como também criou um desestímulo ao próprio parcelamento. Em se tratando de lei penal mais rigorosa, não poderá retroagir no tempo nem mesmo ser aplicada para casos em andamento, podendo ter validade apenas para os casos de débitos tributários constituídos definitivamente depois da data de sua vigência. Mais um motivo para se evitar a sonegação fiscal.
Lógico que os contribuintes que aderiram ao último grande parcelamento tributário (REFIS DA CRISE) e estão adimplentes não estão subordinados ao preceituado pela Lei 12.382/2011, pois a legislação criadora daquele parcelamento (5) foi enfática quanto aos crimes tributários, verbis:
“Art. 68. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, limitada a suspensão aos débitos que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento, enquanto não forem rescindidos os parcelamentos de que tratam os arts. 1o a 3o desta Lei, observado o disposto no art. 69 desta Lei.
Parágrafo único. A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.
“Art. 69. Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no art. 68 quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento.
Parágrafo único. Na hipótese de pagamento efetuado pela pessoa física prevista no § 15 do art. 1o desta Lei, a extinção da punibilidade ocorrerá com o pagamento integral dos valores correspondentes à ação penal.”
É de suma importância, portanto, que os contribuintes que parcelaram débitos através do REFIS DA CRISE, cujos levantamentos fiscais foram objeto de denúncia criminal, sejam rigorosamente pontuais nas quitações das parcelas mensais, para continuarem com os respectivos processos criminais suspensos, até que ocorra a quitação total dos débitos, cuja conseqüência será a extinção do processo criminal.
É oportuno ressaltar a existência de muitas dívidas tributárias podres (por decadência, prescrição ou prescrição intercorrente ou ainda sócios respondendo indevidamente por dívida da empresa, além de multas previdenciárias ilegais e derivadas de obrigações acessórias que foram reduzidas por lei, mas não recalculada pela PGFN) sendo cobradas via judicial em tramitação nos vários fóruns federais e estaduais. Em nosso livro reduza dívidas previdenciárias trabalhamos de forma pragmática esses tópicos contidos no estoque da dívida ativa da união.
O grande órgão arrecadador federal foi criado na época da vigência do AI-5 (Ditadura Militar) e tem o DNA do autoritarismo, sempre desrespeitando os direitos dos contribuintes, órfão de um Código de Defesa, por omissão do Legislativo.
V – Conclusão
Diante do exposto podemos concluir que sonegar tributos e/ou contribuições ou omitir informações obrigatórias não é a melhor decisão que o cidadão contribuinte deva tomar. Vale observar que presidentes e diretores de entidades do terceiro setor também estão sujeitos a serem processados criminalmente, caso haja vacilo em suas decisões em relação ao cumprimento de suas obrigações tributárias.
Enfim, sonegar não compensa. Com a alta carga tributária e o cipoal de textos legais que necessitam ser cumprido pelos gestores de tributos, formalizar, pois si só é um alto risco para o cidadão brasileiro que, apesar da constituição cidadã de 1988, é obrigado a submeter à legislação tributária (exceção do Simples Nacional) forjada pela Ditadura Militar e que vigora até hoje!
Notas
1) Lista de tributos e contribuições: http://www.economiatributaria.com.br/tributos.html
2) AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – Processo nº 2009.38.00.033770-4, despacho Publicado em 17/08/2010 no e-DJF-1.
3)http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/PSV_29.pdf
4) LEI Nº 12.382, DE 25 DE FEVEREIRO DE 2011.
5) Lei no 11.941, de 27 de maio de 2009.
Roberto Rodrigues de Morais
Membro do Conselheiro Editorial ATC/COAD
COLUNISTA na REVISTA CONTABILIDADE E GESTÃO COAD
Especialista em Direito Tributário.
Controle de Qualidade ATC/COAD
CONSULTOR TRIBUTÁRIO em Belo Horizonte – MG.