Para o Sped Fiscal, cada estado adota um critério para selecionar os contribuintes e estabelecer o cronograma.

Sílvia Pimentel

Quase 41 mil empresas paulistas estão obrigadas a entregar, a partir do próximo mês, os arquivos digitais com informações detalhadas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) ao fisco. A EFD-ICMS/IPI, ou Sped Fiscal, está tirando o sono de empresários e contadores porque a maioria das pequenas e médias empresas na lista da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo (Sefaz-SP) não está preparada para o envio da nova obrigação, na opinião de contadores.

O Sped Fiscal é uma das vertentes do ambicioso projeto de integração das administrações tributárias, conhecido como Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), que entrou em operação a partir de 2009. Em fevereiro daquele ano, 17 grandes companhias selecionadas pelo fisco foram as primeiras a entregar a sua contabilidade no formato digital. Em dezembro, o número saltou para 30 mil, alcançando 50 mil estabelecimentos no final de 2010. No ano passado, o arquivo passou a ser exigido de 150 mil empresas em todo o Brasil.

Em São Paulo, até janeiro de 2014, cerca de 270 mil companhias serão obrigadas a trocar livros fiscais de papel por arquivos digitais para prestar contas ao Leão. O que preocupa é que, desta vez, é que o projeto Sped começa a alcançar pequenos e médios empresários, que devem gastar com sistemas e treinamento de pessoal. Por ora, no estado paulista, estão dispensadas da exigência as empresas optantes pelo Simples Nacional e os Microempreendedores Individuais.

A proximidade do prazo de entrega tem gerado um certo atrito entre contadores e seus respectivos clientes. “O Sped Fiscal é o que mais precisa da intervenção do empresário na geração das informações solicitadas pelo fisco. O contador não dispõe de todos os dados. Trata-se de um arquivo que precisa ser gerado a quatro mãos”, afirma o diretor de franquias da Prosoft Tecnologia, Iron Garrido. A empresa desenvolve softwares contábeis e tem os escritórios de contabilidade como principais clientes. Ele explica que, inicialmente, a exigência do arquivo pelo fisco paulista estava prevista para o início do próximo ano. Mas a Sefaz-SP antecipou a entrega por meio da resolução Deat nº 5, publicada em maio. “O aviso sobre a entrega precoce foi feito até com relativa antecedência. Mesmo assim, pegou de surpresa muitas empresas”, disse.

O primeiro lote dos quase 41 mil empreendimentos paulistas obrigados a enviar o Sped Fiscal contém companhias do setor industrial, principalmente. As empresas do comércio devem estrear a nova forma de prestação de contas a partir de janeiro de 2013. A resolução traz seis anexos com os CNPJs dos contribuintes e as datas para o início das entregas. No dia 25 de novembro, as empresas selecionadas devem entregar os dados relativos ao mês de outubro. E há muitos empresários desavisados.

Para o Sped Fiscal, cada estado adota um critério para selecionar os contribuintes e estabelecer o cronograma. O mesmo ocorre com a multa por atraso ou não entrega da obrigação. Em São Paulo, por exemplo, os valores são os mesmos aplicados nos casos de não entrega dos livros fiscais impressos, ou seja, equivalem a 1% do valor das operações que deixaram de ser informadas.

O consultor tributário da Confirp, Welinton Motta, vive de perto essa nova realidade e os dilemas trazidos pela exigência do Sped. Quanto ao cumprimento dos prazos, ele diz que os clientes que delegaram ao escritório a tarefa de fazer a escrituração fiscal no formato exigido pelo fisco não têm com o que se preocupar. “Entretanto, há clientes que usam sistemas próprios que enfrentam problemas de toda ordem para se adequar, e correm risco de não entregarem no prazo ou, em último caso, enviarem os dados incorretos para, no futuro, entregar uma declaração retificadora, no prazo de 60 dias, permitido pela legislação”, explica. De acordo com ele, o Sped Fiscal é um sistema complexo e que exige dados corretos de vários departamentos da empresa, como a contabilidade, o estoque e a área financeira. Em outras palavras, a qualidade das informações e, portanto, o risco menor de ser apanhado pela fiscalização, depende do nível de gestão empresarial e da capacitação profissional. “O dígito errado de um simples número pode comprometer toda a informação. E há casos em que o sistema é alimentado de forma correta, mas o mesmo não funciona como deveria”, explica.

Investimento não garante êxito

A Cabo Lappi Brasil, importadora de cabos flexíveis para a indústria, é uma das empresas que enfrentam problemas para cumprir a exigência do Sped e tem investido pesado para solucioná-los. A entrega está prevista para janeiro de 2013, mas a responsável pela área financeira e contábil, Adriana Simão, tem dúvidas sobre o cumprimento do prazo. “Apesar da aquisição do módulo correspondente à obrigação, não temos tido sucesso na geração do arquivo”, afirma.

Após investir na aquisição do sistema SAP, mais usado por médias e pequenas empresas, e dos módulos para gerar os arquivos digitais, a empresa teve que contratar funcionários para realizar o trabalho manualmente, ao custo mensal de R$ 3 mil. Além disso, gastou R$ 80 mil na contratação de uma consultoria para realizar ajustes no sistema. Isso sem contar os futuros gastos com treinamento dos funcionários da empresa. “Creio que esse sistema, que é europeu, não consegue atender à demanda fiscal brasileira, que é muito complexa. Para funcionar, é preciso adquirir vários módulos”, desabafa.

O administrador de empresas, palestrante e professor de pós-graduação da PUC-MG, Roberto Duarte, alerta que o problema é mais grave do que se imagina. Isso porque os empresários que não fizeram esforços para melhorar suas empresas têm dois desafios: implementar gestão e entregar o Sped. “É um chamado à gestão empresarial. O Estado está impondo um processo de governança. Como sócio das milhões de empresas brasileiras, ele quer saber o que compramos, o que vendemos, quanto e quando. Quer controlar o nosso estoque, nosso ativo permanente. Quer saber o que pagamos e recebemos. E, por fim, como calculamos e pagamos os tributos”, diz.

Segundo ele, sem o envolvimento dos líderes, as corporações gastarão muito com consultorias, software, mas continuarão com erros graves no Sped. Ou seja, o primeiro passo é a sensibilização de diretores, gestores e donos das empresas. Depois, entra a questão tecnológica, tributária e os procedimentos.

Investimento – Na opinião da sócia da Trevisan Gestão & Consultoria, Geuma Nascimento, os empresários devem entender o Sped não como uma despesa, mas como um investimento, cujo retorno se dá pela melhoria da produtividade, dos controles e das informações gerenciais para tomada de decisão. Os dados da empresa precisam estar organizados para a correta entrega do arquivo. “Possivelmente, muitas empresas de pequeno porte perderão o prazo de entrega e vão gerar arquivos com informações incorretas”, diagnostica.

Fonte: Diário do Comércio