O Supremo Tribunal Federal julgou, na mesma data, dois Recursos Extraordinários que tratam da mesma matéria. Em síntese, os dois REs buscam definir os limites e alcances do ICMS nas importações de mercadorias do exterior do país, realizadas por pessoas não contribuintes do imposto, cujas operações já ocorreram sob a vigência da EC 33/2001.

Matéria anteriormente julgada pelo Supremo Tribunal Federal, sob a redação original do artigo 155 parágrafo 2º, inciso IX, alínea “a” da Constituição Federal, as decisões foram favoráveis aos importadores e provocou a promulgação da Emenda Constitucional 33/2001 para aperfeiçoar o texto constitucional e não deixar nenhuma dúvida sobre o alcance do ICMS nas importações.

O texto original da Constituição Federal tinha a seguinte redação:

“IX – incidirá também:
Sobre a entrada de mercadoria importada do exterior, ainda quando se tratar de bem destinado a consumo ou ativo fixo do estabelecimento, assim como sobre serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o estabelecimento destinatário da mercadoria ou do serviço.”

Após a Emenda Constitucional 33/2001 a Constituição Federal passou a trazer a seguinte disposição:

“IX – incidirá também:
a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço.”

Mesmo sob a égide no novo dispositivo constitucional o Plenário negou provimento ao RE 474.267/RS interposto pela Fazenda Pública gaúcha e deu provimento ao RE 439.796/PR interposto por pessoa não contribuinte do ICMS, domiciliada no Estado do Paraná.

Nos dois julgamentos o Supremo Tribunal Federal deixou evidente que após a EC 33/2001 é irrelevante a classificação jurídica do importador para fins de incidência do ICMS nas importações de mercadoria ou bem do exterior do País.

No entanto, mesmo realizados após a EC 33/2001 as exigências tributárias contidas nos REs 474.267/RS e 439.796/PR foram extintas pelo Plenário do STF. A Corte decidiu que não basta a Constituição Federal autorizar o lançamento. A validade do crédito tributário depende da existência de lei complementar sobre normas gerais e de legislação local de instituição do imposto sobre as importações realizadas por pessoas que não sejam contribuintes.

Os julgamentos, sob a relatoria do Ministro Joaquim Barbosa, decidiram que a incidência do tributo também depende da observância das regras de anterioridade e de irretroatividade aferidas na legislação de cada Estado ou do Distrito Federal. Portanto, não se admite a constitucionalidade superveniente para legitimar lei estadual anterior à EC 33/2001.

Em síntese o Supremo Tribunal Federal deixou expresso que é preciso Lei Estadual/Distrital publicada após a EC 33/2001 e à Lei Complementar 114/2002 fixando a hipótese de incidência para que o Estado ou o Distrito Federal possa constituir o lançamento do ICMS nas importações de bens realizados por pessoas não contribuintes do imposto. E ainda foi mais incisivo ao definir que Lei anterior que fixa a hipótese de incidência não foi constitucionalizada pela EC 33/2001. É necessária Lei nova que já nasce constitucional, sob o manto no novo texto do artigo 155 parágrafo 2º, inciso IX, alínea “a” da Constituição Federal.

Observa-se que o Estado de São Paulo, por exemplo, alterou a regra-matriz do ICMS em 21.12.2001 (após a EC 33/2001) por meio da Lei Estadual 11.001 que trouxe nova redação do artigo 1º, inciso V da Lei Estadual 6374/89:

“Art. 1º O Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS incide sobre:
V – entrada de mercadorias ou bem, importados do exterior por pessoa física ou jurídica, qualquer que seja a sua finalidade;”

No entanto, essa mudança na lei paulista ocorre em momento anterior à mudança na Lei Complementar 87/96, que só ocorreu em 16.12.2002 por meio da Lei Complementar 114 que alterou a redação do parágrafo 1º do artigo 2º da Lei Complementar 87/96, deixando-o com a seguinte redação:

“I – sobre a entrada de mercadoria ou bem importados do exterior, por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade;”

Pelas decisões emanadas do Pleno do Supremo Tribunal Federal, nos julgamentos dos REs: 474.267/RS e 439.796/PR, há obrigações que o legislador estadual ou distrital precisam cumprir para que a exigência tributária venha revestida de constitucionalidade. As vinte e sete unidades da Federação precisam atender os princípios fixados nos dois julgamentos para que a exigência do ICMS nas importações realizadas por não contribuintes do ICMS possam prevalecer no julgamento do Poder Judiciário.

No mais, o Supremo Tribunal Federal deixou registrado que não mais prevalece nenhuma das três restrições fixadas pela Corte nos julgamentos precedentes à EC 33/2001. Assim, após a alteração do texto constitucional o STF entendeu, no transcurso do julgamento dos dois REs que:

a) A caracterização do bem como mercadoria independe da qualidade jurídica do adquirente;
b) Não há cumulatividade a ser compensada, pois o ICMS sobre a importação de bens, por não contribuintes do imposto, se trata de operação única.

A falta de critério para definição do sujeito passivo da obrigação tributária foi corrigida mediante a inserção da palavra “domicilio” na alínea “a” do inciso IX do parágrafo 2º do artigo 155 da Constituição Federal.

Do mesmo modo que o Pleno do STF reconhece a abrangência do novo texto constitucional, capaz de dirimir eventuais dúvidas sobre o campo de incidência do ICMS nas importações, fixa limites ao processo legislativo estadual ou distrital para dar estabilidade à cobrança do imposto.

De acordo com a jurisprudência da Corte a autorização constitucional que faz surgir a competência tributária é insuficiente para justificar a cobrança do tributo mediante a constituição de crédito tributário. É necessário que a norma que cria o tributo deve encontrar fundamento de validade nas normas gerais para assegurar estabilidade à cobrança. Para ser considerada válida a constituição do crédito tributário é necessária a presença de três condicionantes:

a) Existência de competência;
b) Exercício dessa competência pela União ao fixar a norma geral em matéria tributária;
c) Exercício de competência por cada um dos Estados e pelo Distrito Federal.

No entanto, como bem observou o Supremo Tribunal Federal nos julgamentos dos REs 439.796 e 474.267, alguns entes federados teriam se precipitados em relação à EC 33/2001 ou em relação à Lei Complementar 114/2002. Teriam, esses Estados, fixados regras-matrizes sem observar o fundamento de validade. Mediante o critério de validade da norma matriz o STF definiu que para ser constitucionalmente válida a incidência do ICMS sobre operações de importação de bens, as modificações no critério da base de cálculo e na fixação do sujeito passivo da regra-matriz deveriam ter sido realizadas em Lei Estadual/Distrital posterior à EC 33/2001 e à LC 114/2002.

Os Estados e o Distrito Federal que não atendem a exigência da validade jurídica da regra-matriz, como definidas pelo STF, estão sob risco de sofrerem novas derrotas no Judiciário ao tentarem a cobrança do ICMS nas importações realizadas por não contribuintes do ICMS.

José Antonio Pachecco – Ex Agente Fiscal de Rendas do Estado de São Paulo. Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil aposentado.

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