A Receita Federal publicará em outubro duas novas medidas com o objetivo de oferecer maior segurança jurídica aos contribuintes, em especial às empresas que realizam operações com coligadas no exterior. Uma das novidades é a criação de uma espécie de súmula vinculante administrativa. O que significa dizer que quando uma empresa consultar a Receita para esclarecer dúvida sobre a aplicação de alguma norma, a resposta orientará os fiscais e empresas de todo o país. Hoje, as soluções de consulta, como são chamadas, valem apenas para determinada região fiscal e só para a companhia que buscou a avaliação do Fisco.

Além disso, uma medida provisória será editada para estipular novas margens de lucro para o cálculo do Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) nas operações de empresas brasileiras com coligadas no exterior. A norma vai alterar a Lei nº 9.430, de 1996, que regula o preço de transferência – cujo objetivo é impedir que empresas nacionais reduzam os valores de importados de coligadas no exterior para pagar menos IR e CSLL. A nova MP instituirá margens de lucro indicadas por entidades setoriais.
As informações foram anunciadas pelo secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto, durante o XI Congresso Internacional de Direito Tributário de Pernambuco, finalizado na sexta. Sobre a solução de consulta vinculante, o secretário afirmou que será emitida pela Secretaria da Receita Federal em Brasília e publicada na íntegra, mas de forma que não permita a quebra do sigilo fiscal do contribuinte. “Quando isso ocorrer, será publicado um parecer normativo com o mesmo efeito da solução de consulta”, disse. Atualmente, só é publicado um resumo da solução de consulta.
Para o jurista e tributarista Paulo de Barros Carvalho, a solução de consulta vinculante é fundamental para o equilíbrio entre Fisco e contribuinte. “Hoje, o contribuinte faz a consulta e, às vezes, não vem resposta. Outras vezes demora mais de um ano para receber a solução”, disse. Segundo o jurista, ele pediu ao secretário que fosse fixado um prazo para a Receita dar uma resposta com amplitude nacional, ou prevaleceria o entendimento do contribuinte. “Infelizmente, esse adendo não foi acolhido”, afirmou. A especificidade do negócio de cada empresa será uma das dificuldades enfrentadas pelo Fisco para emitir uma solução de consulta vinculante. Para Carvalho, a equipe da Receita que vai formular tais respostas terá que saber como reconhecer essas peculiaridades.
Já a norma sobre preço de transferência será alterada para tentar diminuir o volume de litígios sobre o tema entre Fisco e contribuintes. “Vamos rever essa legislação para instituir maior segurança jurídica”, afirmou o secretário da Receita. Conforme informou ao Valor, entidades representantes de cada setor estão sendo ouvidas para ser feita a revisão das margens de lucro usadas para o cálculo dos tributos. “Essas novas margens constarão da própria lei, mas o contribuinte que não concordar poderá apresentar um novo percentual, comprovado por estudo, para aprovação da Fazenda.”
A presidente do Instituto Pernambucano de Estudos Tributários (Ipet), Mary Elbe Queiroz, lembra que, em 2009, a Medida Provisória nº 478 tentou alterar o cálculo do preço de transferência, mas não foi convertida em lei a tempo. A MP havia sido aprovada às vésperas do fim do ano, entre disposições sobre outros temas. Dessa vez, com a prévia discussão com as entidades setoriais espera-se uma norma mais condizente com a realidade das empresas. “Isso marca uma nova era do relacionamento entre Fisco e contribuinte”, comentou o professor e tributarista Heleno Taveira Torres, que foi homenageado no congresso. Ele também afirmou que a Receita Federal abrirá uma oportunidade para as empresas pagarem os tributos de acordo com um segundo método de cálculo de preço de transferência, caso o primeiro seja desconsiderado pelo Fisco, evitando assim autuações e litígios. (A repórter viajou a convite do Instituto Pernambucano de Estudos Tributários – Ipet)
Fazenda quer acelerar cobrança judicial
Enquanto o projeto de lei que altera a lei de execuções fiscais não sai do papel, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) preparou algumas alternativas para apresentar ao Ministério da Fazenda e tentar diminuir a dívida ativa da União. A proposta, que está parada no Congresso Nacional, trata apenas da execução administrativa. “Nós vamos propor um aperfeiçoamento da lei de execução judicial para haver mais celeridade e eficácia na recuperação da dívida ativa”, disse o diretor do Departamento de Gestão da Dívida Ativa da União na PGFN, Paulo Ricardo de Souza Cardoso, durante o XI Congresso Internacional de Direito Tributário de Pernambuco, que terminou na sexta-feira.
Hoje, a dívida ativa da União é de aproximadamente R$ 1 trilhão. Desse total, R$ 837,5 bilhões estão em discussão judicial. Uma das propostas da PGFN é deixar de ajuizar execução fiscal ou arquivá-la caso o devedor não tenha bens ou patrimônio para serem penhorados. A procuradoria quer ainda que as execuções passem só a tramitar na esfera federal. “Com a interiorização da Justiça Federal, não há motivo para a execução fiscal tramitar na esfera estadual, onde os juízes julgam briga de vizinhos e batida de carro”, afirmou Cardoso.
Segundo ele, a PGFN também quer criar um instrumento alternativo ao leilão judicial para agilizar a venda de bens. Outra medida que seria eficaz, conforme Cardoso, é a averbação em cartório das Certidões de Dívida Ativa (CDA), para dificultar a venda de bens e direitos sujeitos à penhora. Além disso, seria feita a notificação do devedor para conhecimento do inteiro teor da CDA. “Com a notificação, o contribuinte teria que pagar o débito em cinco dias, ou indicar bens à penhora antes do início da fase judicial”, diz.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) criticou as propostas apresentadas pela PGFN. Segundo o advogado Antônio Carlos Rodrigues do Amaral, vice-presidente da Comissão de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB, só seria possível vender bens sem a realização de um leilão se houvesse algum controle pelo Judiciário, para garantir uma justa avaliação. Ele afirmou também que a penhora não pode ser realizada diretamente pela PGFN, sem intervenção da Justiça, pois seria um constrangimento ao cidadão. “A averbação também não seria possível. A certidão não é um título líquido e certo. É a Fazenda dizendo que o contribuinte deve, o que pode ser contestado no Judiciário”, disse.
Segundo Cardoso, as propostas foram elaboradas a partir de uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) a pedido do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O levantamento concluiu que 4,96 bilhões de processos que tramitam na Justiça Federal são da PGFN (32% do total). Hoje, o tempo médio da tramitação de uma execução fiscal é de oito anos. (LI)
Fonte: Valor Econômico / por Fenacon
Escrito por: Laura Ignacio